quarta-feira, 31 de março de 2021

Moradores de Póvoa da Isenta formam comissão de cidadania em defesa do a...

DIA MUNDIAL DO TEATRO 2021 - HELDER COSTA

Quem tem medo do teatro ? 
 

Que pergunta ridícula, não é ? Ter medo do teatro, de uma peça, de uns actores que nos preenchem momentos de ócio?! Que absurdo!...

Mas...será que aqueles que têm medo de se verem retratados na praça pública gostam de teatro?

E os que pensam que o teatro só serve para fazer agitação política?

E os outros que lutam para que o teatro não tenha nada a ver com política? Como se isso fosse possível !!!

E os que têm horror ao humor e ao cómico que é impiedoso a descarnar situações, personagens e comportamentos ?

E os que fogem da emoção e das lágrimas ?

E os que  se recusam a pensar e a olhar para o seu mundo ?

E os que  não se querem ver nas más companhias dos artistas ?

  E os que julgam que os artistas  não passam de marginais e falhados sociais?

Gente infeliz, com certeza. Muita gente infeliz.

Tudo isto, e se calhar falta alguma coisa, são factores de crise. Mas o pessimismo é o sentimento mais reaccionário do mundo e eu continuo a acreditar no valor transformador das crises.

Porque o teatro é uma corrente de felicidade e de afectividade contra o egoísmo e o medo.

Luta por participar, comunicar, e por se entender entre si e os outros.

Sabe que pode desbloquear insegurança, que consegue abrir sentimentos e que transforma o acto poético em acto de vida.

Contra isso esbarram e são derrotados mil conceitos reaccionários: intrigas, invejas, discriminações sociais e económicas ( sim, estou a pensar nos subsídios do Estado), a cobardia dos lacaios de “quem está a mandar”, e a parolice  dos admiradores incultos de vários modismos

( estéticos, éticos, políticos).

Quem não tem medo do teatro é quem ama a vida, quem aceita as suas contradições, e quem sabe que o mundo está em eterna transformação.

Pessoalmente, continuo a ter um gosto e convicções profundas em relação aos méritos do humor, do riso e do absurdo por vezes violento e pouco cómico, na exposição e desmontagem dos mecanismos que nos cercam nesta, parece que dolce vita, que nos dizem que temos.

sábado, 27 de março de 2021

A árvore das emissões neutras, nova fraude do capitalismo verde – João Camargo

Com certeza já reparou, perto das bombas de gasolina da BP, que a mesma anuncia que se encher ali o seu depósito, as suas emissões serão “compensadas” e que portanto não tem mesmo de se preocupar com as alterações climáticas enquanto o seu motor queima derivados de petróleo e emite dióxido de carbono. Más notícias: é mentira. A plantação de árvores em grande escala é só o mais recente prato do dia do menu infinito de falsas soluções do capitalismo verde.

Começo por repetir o que o melhor da ciência climática tem para dizer: para evitar ultrapassar o aumento de 1,5ºC até 2100 é necessário realizar um corte de 50% das emissões globais de gases com efeito de estufa até 2030, em relação ao nível de emissões de 2010. É um corte gigantesco que temos de fazer enquanto espécie, para tentar manter as condições climáticas e materiais que permitiram a existência de civilizações humanas. Como é mesmo o que temos de fazer, os grandes emissores e aqueles que construíram os seus impérios, o seu status e a sua riqueza em cima destas emissões, tudo dirão e tudo farão para evitar fazê-lo, mesmo que tal nos custe (a todos) qualquer espécie de futuro.

A crítica à neutralidade de carbono não se prende com o conceito em si, mas com a visão oportunista do sistema capitalista e seus principais agentes, que sempre criaram a sua própria contabilidade para evitar pagar impostos, para travar transferências de riqueza, para esconder e especular com dívidas públicas e privadas. Com esta maneira de ver o mundo, naturalmente olharam para o conceito de neutralidade carbónica e pensaram: “Porque raio hei de cortar emissões se posso aumentar as coisas que retiram essas emissões da atmosfera?”. E vai de inventar: engenhocas à la professor Pardal, que chupariam dióxido de carbono da atmosfera, chamadas de ‘captura e armazenamento de carbono’, e tentar aumentar a capacidade de absorção dos sistemas naturais como os oceanos ou as florestas (chamadas de ‘Soluções Baseadas na Natureza’).

Felizmente não avançou em grande escala a proposta de despejar ferro nos oceanos para aumentar a capacidade de absorção de CO2, com os vários impactos negativos associados a esta operação, mas nos últimos tempos têm surgido os planos megalómanos de plantação em grande escala como milagre. O plano “vilão Bond” da petrolífera Shell, por exemplo, diz que é necessário plantar uma área de floresta equivalente à área do Brasil para manter o aumento da temperatura abaixo dos 1,5ºC até 2100 (é claro que este plano implica eles continuarem a explorar petróleo e gás). A própria Shell propõe-se plantar uma área do tamanho de Espanha, enquanto a ENI propõe plantar uma área do tamanho da Áustria. Talvez estejam à espera que Elon Musk comece a leiloar terrenos em Marte para plantar lá? Este é só o primeiro e evidente sinal da impossibilidade desta solução. Mas tento responder a duas perguntas.

Porque é que plantações florestais não são uma boa solução para a crise climática?

  • Porque não há área suficiente no planeta Terra para compensar as emissões actuais, quanto mais o aumento de produção de petróleo e gás preconizado por muitas destas empresas;
  • Porque a capacidade da maior parte das florestas do mundo para retirar carbono da atmosfera está a reduzir-se e não a expandir-se, por causa dos efeitos da crise climática;
  • Porque para ser um verdadeiro sumidouro de carbono, com absorção estável, as florestas demoram décadas e até séculos a constituir-se e a acumular carbono nos solos, árvores, plantas e outros seres vivos – plantações florestais não são nada disto e derivam de uma visão do meio natural como algo totalmente plástico e moldável às necessidades imediatas do lucro;
  • Porque todas estas propostas assentam no oportunismo dos sectores que não querem cortar emissões e dos sectores que já operam nesta área, como as celuloses e a bioenergia, que buscam sempre mais uma fonte de rendimento e pervertem qualquer boa solução, promovendo as curtas rotações que colocam o CO2 na atmosfera quando as árvores são processadas.

Porque é que as plantações florestais são muito má ideia para a crise climática?

  • Porque as operações nos solos necessários para instalação de grandes extensões florestais levam a uma libertação massiva de CO2 actualmente retido nos solos;
  • Porque existe um risco já confirmado de que muitas destas plantações seriam instaladas em ecossistemas como pradarias, savanas, tundras e zonas húmidas modificadas, destruíndo esses sistemas e libertando o CO2 aí retido;
  • Porque a plantação indiscriminada de árvores sem critério (e é obviamente disso que se trata quando falamos nesta escala) aumenta o risco de incêndios florestais, aumentando até o risco para as florestas antigas;
  • Porque há várias décadas que, sob o guarda-sol das compensações de emissões de carbono, o que vemos são impactos sociais massivos, roubos de terras, despejos, desflorestação e destruição de biodiversidade nas comunidades rurais dos países mais pobres.

O ciclo de carbono tem partes rápidas e lentas. As rápidas compreendem a circulação entre a atmosfera, a terra, os ecossistemas e os oceanos, enquanto as lentas compreendem a circulação entre a atmosfera e as rochas que compõem a geosfera. Os combustíveis fósseis vêm da circulação lenta entre a atmosfera e as rochas, e a civilização industrial baseada na combustão do petróleo, gás e carvão provocaram um desequilíbrio geológico que não pode ser resolvido pela parte rápida do ciclo de carbono. Neste sentido, estas propostas não são só complexas e incertas: é uma impossibilidade elas resolverem o problema, e ameaçam agravá-lo.

Finalmente, há uma derradeira realidade que deve assentar como uma forte chapada na cara dos propagandistas desta solução: a desflorestação. O mundo não está a ganhar área florestal: está a perdê-la a um ritmo estonteante. Está a perdê-la não só porque a crise climática está a tornar territórios que antes tinham condições para ter florestas em territórios que já não as conseguem nutrir, mas porque há uma acção direccionada e activa por parte de governos e empresas para derrubar áreas florestais fulcrais para a regulação climática do nosso planeta. O Bornéu malaio e indonésio está a ser substituído por plantações de palma, celuloses e barragens, a Amazónia, em particular no Brasil, Perú e Colômbia, está a ser devastada para a instalação de pastos para gado, para extracção da maneira, para instalação de minas, para a produção de soja e biocombustíveis. Desde 2001, a cobertura arbórea global reduziu-se em 10% (mais do que a área da Índia). Desde 2002, as florestas húmidas perderam 6% da sua área (mais do que área de Espanha). O governo russo conseguiu fazer melhor: contar a capacidade de absorção da sua área florestal actual, uma área equivalente a duas Índias, “converter” essa capacidade em créditos de carbono e quer vendê-la a outros poluidores (incluíndo os grandes emissores russos) como “compensação” de emissões. Não é preciso sequer plantar, basta existir que compensa as novas emissões.

O circo das plantações florestais como ferramenta para a neutralidade carbónica, a que o governo português e a União Europeia aderiram efusivamente, só serve para fazer de nós palhaços mortos. É necessário cortar os 50% de emissões globais na próxima década, sim ou sim. Se isso significa que a maior parte das petrolíferas terão de falir? Sim.


Artigo originalmente publicado no Expresso a dia 26 de Março de 2021

MOMENTO DE POESIA Europa I – Adolfo Casaes Monteiro, dito por Mário Viegas. Um poema algo profético “Sobre os escombros da Europa, almejando uma Europa (re)unida e sem fronteiras!”

comercioenoticias, 25/03/2021


O Movimento Cívico Ar Puro - Rio Maior, no âmbito da Campanha Gás é andar para trás, considera que as propostas em apreciação para a aprovação de uma Lei de Bases do Clima constituem, em alguns pontos, um passo positivo. Mas consideramos também que demonstram ainda pouca ambição em relação às metas que a ciência nos diz serem necessárias para evitar os piores efeitos das alterações climáticas. Em particular, é necessário ter em maior consideração o papel que o gás fóssil (dito “natural”) ainda representa no sistema energético português (desde a geração de eletricidade ao consumo doméstico, ao transporte e à indústria) e o seu impacto climático, ambiental e social. Consideramos que os projetos-lei em apreciação não levam suficientemente em conta este aspeto e deixamos um conjunto de recomendações no sentido de remediar essa grave lacuna.

Introdução

Existe uma retórica falsa, propagandeada em publicidade empresarial, discursos institucionais e políticos, de que o gás fóssil é caracteristicamente “natural”. O adjetivo “natural”, que acompanha todas as referências ao gás, carrega conotações de uma origem não poluente e amiga do ambiente. Esta retórica tem de ser urgentemente desconstruída e eliminada. O gás é tão “natural” como o carvão ou o petróleo, tendo-se formando ao longo de milhões de anos nos mesmos tipos de depósitos geológicos e por processos semelhantes. É um recurso não renovável (exceto numa eventual escala de milhões de anos…) e constituído em cerca de 90% por metano, um gás que tem um potencial de aquecimento cerca de 80 vezes superior ao dióxido de carbono, num horizonte temporal de 20 anos. É, pois, o termo “gás fóssil” que deve ser utilizado na linguagem corrente e no discurso político e mediático, associado à perceção clara de este ser apenas mais um combustível fóssil que origina, em muitos casos, emissões de Gases de Efeito de Estufa (GEE) ainda mais elevadas do que o carvão ou o petróleo.

Nest contexto, foi demonstrado em 2011, por investigadores norte-americanos, que num horizonte temporal de 20 anos (aquele que mais importa, para evitar os piores efeitos de crise climática e atingir as metas do Acordo de Paris) o gás extraído a partir de formações de xisto via fraturação hidráulica pode ter o dobro do impacto climático do carvão, em termos de gramas de carbono emitidas por unidade de energia. Isto quando se inclui de igual modo as emissões de metano e não se consideram apenas as de dióxido de carbono, tendo em conta toda a cadeia de produção1. Estas descobertas não só foram validadas por centenas de outros cientistas desde então, como são hoje consideradas consensuais. Mesmo o gás fóssil extraído via técnicas convencionais pode ter uma pegada de carbono superior à do carvão e do petróleo, quando entramos em conta com as emissões de metano associadas à extração e transporte do gás.

É apenas no processo final de queima que o gás fóssil tem emissões de GEE inferiores, em média, ao petróleo e ao carvão. Isto significa que os países que substituam carvão e petróleo por gás estão, em larga medida, a exportar as suas emissões domésticas: para os países onde o gás é extraído e processado, e para o transporte internacional, sobretudo o marítimo, na forma de “Gás Natural Liquefeito” (GNL). Este mecanismo é também por vezes denominado de “carbon leakage”, ou “fuga de carbono”, e é contrário aos princípios do Acordo de Paris. Se Portugal e outros países da União Europeia reduzirem as suas emissões de GEE, à custa do exportá-las para outras partes do globo, isto de nada servirá para mitigar a emergência climática e poderá mesmo contribuir para piorar o problema.

Propostas a incluir numa Lei de Bases do Clima

Depois de uma análise cuidadosa de todos os 8 projectos-lei, detetámos os seguintes pontos críticos, que mais se relacionam com a área de intervenção da Campanha Gás é Andar para Trás e que consideramos não estarem a ter a devida atenção nas propostas em apreciação.

1 - Alguns dos projectos-lei propõem que a técnica de fraturação hidráulica seja interdita em território nacional. Congratulamo-nos com esta posição e apelamos a que seja incluída na versão final da Lei de Bases do Clima.

2 - Salientamos, no entanto, que a Lei de Bases do Clima deve também incluir a proibição de importação de gás e petróleo que sejam extraídos através da técnica de fraturação hidráulica. Consideramos que Portugal, enquanto país da União Europeia e OCDE, e membro do clube das economias mais desenvolvidas, tem uma responsabilidade histórica no combate às alterações climáticas. Se decidimos proibir uma técnica em território nacional, não devemos depois estar a comprar combustíveis fósseis provenientes de outros países extraídos pela mesma tecnologia. Isso seria apenas uma exportação do nosso impacto climático para outros territórios e nada faria para travar a emergência climática.

3 - Consideramos que uma Lei de Bases do Clima deveria ainda incluir de forma muito explícita uma proibição da atribuição de novos contratos de prospeção, pesquisa, desenvolvimento e exploração de combustíveis fósseis em todo o território nacional, quer em terra quer em mar, através da revogação clara e inequívoca do Decreto-Lei 109/94, de 1994, que ainda regula esta atividade. Notamos que no caso dos 2 contratos mais recentes, na zona Centro do país, denominados Batalha e Pombal, a empresa que os detinha sempre afiançou que não iria recorrer à técnica de fraturação hidráulica, nunca tendo sido desmentida pelo Estado português. Sendo assim, uma mera proibição desta técnica (ver ponto 1) não cancela a ameaça da atribuição de novos contratos. Após uma vasta mobilização de dezenas de milhares de pessoas por todo o país contra a prospeção e exploração de hidrocarbonetos, e de um vasto debate na opinião pública, ficou claro que esta não é uma via razoável para o desenvolvimento sustentável do país. Logo, esta Lei de Bases do Clima parece-nos a ocasião ideal para tranquilizar os receios da população, e proibir expressamente a atribuição de novos contratos deste tipo em território nacional. Isto permitiria anunciar à comunidade internacional e às empresas do sector que não haverá prospeção nem exploração de combustíveis fósseis em Portugal, o que seria um exemplo de boas práticas a nível mundial.

4 - Defendemos ainda o encerramento faseado de todas as infraestruturas existentes de produção de eletricidade a partir de gás fóssil, com uma transição justa que garanta formação profissional e emprego decente para quem neste momento depende do trabalho nestas empresas. Notamos com agrado que pelo menos um dos (8) projectos-Lei defende este encerramento, com uma data-limite de 2040. Consideramos, no entanto, que dado o agravar da crise climática e a reduzida janela temporal de que dispomos, todos os esforços deveriam ser feitos para antecipar esta data ao máximo. O prazo de 2035, ou 2030, de preferência, em conjunto com um plano agressivo para aumentar a geração de eletricidade por fontes renováveis, com destaque para o solar fotovoltaico, seria extremamente importante em termos de redução as emissões de GEE, além de contribuir para aumentar a independência energética de Portugal e melhorar a balança comercial nacional.

5 - A este respeito, notamos que é necessário que haja uma adoção urgente de medidas eficazes de eficiência energética nos edifícios residenciais e comerciais e nos processos industriais, de modo a reduzir o consumo de gás fóssil. Novamente, isto teria não só ganhos climáticos como económicos, ao reduzir a nossa dependência das importações de hidrocarbonetos.

6 - Uma Lei de Bases do Clima é ainda a ocasião ideal para anunciar o cancelamento de todos os projetos de novas infraestruturas de gás, com destaque para os projetos de expansão do Terminal de Gás Liquefeito (GNL) em Sines e o projeto de gasoduto (ligação com Espanha) entre Guarda e Bragança. É com enorme preocupação que notamos o peso crescente que as importações de gás fóssil via GNL têm assumido, com um valor recorde registado no ano de 2019. Esta forma de transporte tem um impacto climático várias vezes superior ao transporte convencional por gasoduto, com perdas diárias de gás (metano) que podem rondar os 0.1 a 0.25% da carga total2.

7 - Por último, mas não menos importante dada a natureza global das cadeias de extração e transformação de hidrocarbonetos, e em particular do gás fóssil, recomendamos que a Lei de Bases do Clima inclua provisões de sustentabilidade, responsabilidade social e governança, com destaque para a proibição de importação de hidrocarbonetos de zonas de conflito armado ou de zonas em que a população local esteja a ser ativamente reprimida. Neste contexto, não podemos deixar de referir o exemplo de Moçambique e a região de Cabo Delgado, onde se desenrola atualmente uma enorme tragédia, com perda de vidas e violações sistemáticas dos direitos humanos3. É de lamentar profundamente que não só grande parte desse conflito gire em torno das reservas de gás da região, como que várias das maiores empresas portuguesas estejam ativamente a investir nesses recursos (cujo mercado de destino são nações asiáticas, via transporte marítimo de GNL) e talvez a contribuir para o agravar da situação4. Portugal tem aqui uma enorme responsabilidade histórica e deveria utilizar toda a sua influência diplomática e económica no sentido de terminar este conflito, em particular, e outros semelhantes. A atual presidência da União Europeia, que termina em final de junho, é uma oportunidade histórica para que o Governo português ajude a colocar a questão de Cabo Delgado no primeiro plano da agenda internacional. Uma Lei de Bases do Clima deveria incluir sólidas provisões de solidariedade internacional e justiça climática de forma explícita, alinhadas com os objetivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas.

Como conclusão, reafirmamos a defesa de uma transição justa e acelerada para alternativas limpas e sustentáveis à energia hoje proveniente do gás fóssil, e denunciamos a narrativa falsa e perigosa que pinta o gás como solução de transição.

quinta-feira, 25 de março de 2021

"EUROPA E AMÉRICA DO SUL. QUE FUTURO?"


 
Webinar Europa e América do Sul. Que Futuro?

O Acordo UE-Mercosul em agenda com a presença de deputados portugueses.
 
O Acordo UE - Mercosul é um tratado de livre comércio que, depois de mais de 20 anos de negociações, foi assinado em Julho de 2019, o seu conteúdo só foi parcialmente partilhado e em linhas gerais poderíamos acrescentar que este acordo pretende trocar “CARROS POR COMIDA”.
 
O tratado de livre comércio envolve, nos dois blocos de países, uma população de 780 milhões de pessoas e a expectativa é que a União Europeia aumente significativamente as suas exportações de automóveis e outros bens industriais, enquanto que, por outro lado, os países do Mercosul aumentem significativamente as suas exportações de alimentos, minerais e outros bens do sector primário.

Vem conhecer mais sobre este acordo comercial.
 
O webinar vai ter lugar no dia 13 de abril, terça-feira, às 18h30.
 

Parecer da Campanha Gás é Andar para Trás sobre a Lei de Bases do Clima

O Movimento Cívico Ar Puro - Rio Maior, no âmbito da Campanha Gás é andar para trás considera que as propostas em apreciação para a aprovação de uma Lei de Bases do Clima constituem, em alguns pontos, um passo positivo. Mas consideramos também que demonstram ainda pouca ambição em relação às metas que a ciência nos diz serem necessárias para evitar os piores efeitos das alterações climáticas. Em particular, é necessário ter em maior consideração o papel que o gás fóssil (dito “natural”) ainda representa no sistema energético português (desde a geração de eletricidade ao consumo doméstico, ao transporte e à indústria) e o seu impacto climático, ambiental e social. Consideramos que os projetos-lei em apreciação não levam suficientemente em conta este aspeto e deixamos um conjunto de recomendações no sentido de remediar essa grave lacuna.

Introdução

Existe uma retórica falsa, propagandeada em publicidade empresarial, discursos institucionais e políticos, de que o gás fóssil é caracteristicamente “natural”. O adjetivo “natural”, que acompanha todas as referências ao gás, carrega conotações de uma origem não poluente e amiga do ambiente. Esta retórica tem de ser urgentemente desconstruída e eliminada. O gás é tão “natural” como o carvão ou o petróleo, tendo-se formando ao longo de milhões de anos nos mesmos tipos de depósitos geológicos e por processos semelhantes. É um recurso não renovável (exceto numa eventual escala de milhões de anos…) e constituído em cerca de 90% por metano, um gás que tem um potencial de aquecimento cerca de 80 vezes superior ao dióxido de carbono, num horizonte temporal de 20 anos. É, pois, o termo “gás fóssil” que deve ser utilizado na linguagem corrente e no discurso político e mediático, associado à perceção clara de este ser apenas mais um combustível fóssil que origina, em muitos casos, emissões de Gases de Efeito de Estufa (GEE) ainda mais elevadas do que o carvão ou o petróleo.

Nest contexto, foi demonstrado em 2011, por investigadores norte-americanos, que num horizonte temporal de 20 anos (aquele que mais importa, para evitar os piores efeitos de crise climática e atingir as metas do Acordo de Paris) o gás extraído a partir de formações de xisto via fraturação hidráulica pode ter o dobro do impacto climático do carvão, em termos de gramas de carbono emitidas por unidade de energia. Isto quando se inclui de igual modo as emissões de metano e não se consideram apenas as de dióxido de carbono, tendo em conta toda a cadeia de produção1. Estas descobertas não só foram validadas por centenas de outros cientistas desde então , como são hoje consideradas consensuais. Mesmo o gás fóssil extraído via técnicas convencionais pode ter uma pegada de carbono superior à do carvão e do petróleo, quando entramos em conta com as emissões de metano associadas à extração e transporte do gás.

É apenas no processo final de queima que o gás fóssil tem emissões de GEE inferiores, em média, ao petróleo e ao carvão. Isto significa que os países que substituam carvão e petróleo por gás estão, em larga medida, a exportar as suas emissões domésticas: para os países onde o gás é extraído e processado, e para o transporte internacional, sobretudo o marítimo, na forma de “Gás Natural Liquefeito” (GNL). Este mecanismo é também por vezes denominado de “carbon leakage”, ou “fuga de carbono”, e é contrário aos princípios do Acordo de Paris. Se Portugal e outros países da União Europeia reduzirem as suas emissões de GEE, à custa do exportá-las para outras partes do globo, isto de nada servirá para mitigar a emergência climática e poderá mesmo contribuir para piorar o problema.

Propostas a incluir numa Lei de Bases do Clima

Depois de uma análise cuidadosa de todos os 8 projectos-lei, detetámos os seguintes pontos críticos, que mais se relacionam com a área de intervenção da Campanha Gás é Andar para Trás e que consideramos não estarem a ter a devida atenção nas propostas em apreciação.



  1. Alguns dos projectos-lei propõem que a técnica de fraturação hidráulica seja interdita em território nacional. Congratulamo-nos com esta posição e apelamos a que seja incluída na versão final da Lei de Bases do Clima.



  1. Salientamos, no entanto, que a Lei de Bases do Clima deve também incluir a proibição de importação de gás e petróleo que sejam extraídos através da técnica de fraturação hidráulica. Consideramos que Portugal, enquanto país da União Europeia e OCDE, e membro do clube das economias mais desenvolvidas, tem uma responsabilidade histórica no combate às alterações climáticas. Se decidimos proibir uma técnica em território nacional, não devemos depois estar a comprar combustíveis fósseis provenientes de outros países extraídos pela mesma tecnologia. Isso seria apenas uma exportação do nosso impacto climático para outros territórios e nada faria para travar a emergência climática.




  1. Consideramos que uma Lei de Bases do Clima deveria ainda incluir de forma muito explícita uma proibição da atribuição de novos contratos de prospeção, pesquisa, desenvolvimento e exploração de combustíveis fósseis em todo o território nacional, quer em terra quer em mar, através da revogação clara e inequívoca do Decreto-Lei 109/94, de 1994, que ainda regula esta atividade. Notamos que no caso dos 2 contratos mais recentes, na zona Centro do país, denominados Batalha e Pombal, a empresa que os detinha sempre afiançou que não iria recorrer à técnica de fraturação hidráulica, nunca tendo sido desmentida pelo Estado português. Sendo assim, uma mera proibição desta técnica (ver ponto 1) não cancela a ameaça da atribuição de novos contratos. Após uma vasta mobilização de dezenas de milhares de pessoas por todo o país contra a prospeção e exploração de hidrocarbonetos, e de um vasto debate na opinião pública, ficou claro que esta não é uma via razoável para o desenvolvimento sustentável do país. Logo, esta Lei de Bases do Clima parece-nos a ocasião ideal para tranquilizar os receios da população, e proibir expressamente a atribuição de novos contratos deste tipo em território nacional. Isto permitiria anunciar à comunidade internacional e às empresas do sector que não haverá prospeção nem exploração de combustíveis fósseis em Portugal, o que seria um exemplo de boas práticas a nível mundial.



  1. Defendemos ainda o encerramento faseado de todas as infraestruturas existentes de produção de eletricidade a partir de gás fóssil, com uma transição justa que garanta formação profissional e emprego decente para quem neste momento depende do trabalho nestas empresas. Notamos com agrado que pelo menos um dos (8) projectos-Lei defende este encerramento, com uma data-limite de 2040. Consideramos, no entanto, que dado o agravar da crise climática e a reduzida janela temporal de que dispomos, todos os esforços deveriam ser feitos para antecipar esta data ao máximo. O prazo de 2035, ou 2030, de preferência, em conjunto com um plano agressivo para aumentar a geração de eletricidade por fontes renováveis, com destaque para o solar fotovoltaico, seria extremamente importante em termos de redução as emissões de GEE, além de contribuir para aumentar a independência energética de Portugal e melhorar a balança comercial nacional.




  1. A este respeito, notamos que é necessário que haja uma adoção urgente de medidas eficazes de eficiência energética nos edifícios residenciais e comerciais e nos processos industriais, de modo a reduzir o consumo de gás fóssil. Novamente, isto teria não só ganhos climáticos como económicos, ao reduzir a nossa dependência das importações de hidrocarbonetos.



  1. Uma Lei de Bases do Clima é ainda a ocasião ideal para anunciar o cancelamento de todos os projetos de novas infraestruturas de gás, com destaque para os projetos de expansão do Terminal de Gás Liquefeito (GNL) em Sines e o projeto de gasoduto (ligação com Espanha) entre Guarda e Bragança. É com enorme preocupação que notamos o peso crescente que as importações de gás fóssil via GNL têm assumido, com um valor recorde registado no ano de 2019. Esta forma de transporte tem um impacto climático várias vezes superior ao transporte convencional por gasoduto, com perdas diárias de gás (metano) que podem rondar os 0.1 a 0.25% da carga total2.




  1. Por último, mas não menos importante dada a natureza global das cadeias de extração e transformação de hidrocarbonetos, e em particular do gás fóssil, recomendamos que a Lei de Bases do Clima inclua provisões de sustentabilidade, responsabilidade social e governança, com destaque para a proibição de importação de hidrocarbonetos de zonas de conflito armado ou de zonas em que a população local esteja a ser ativamente reprimida. Neste contexto, não podemos deixar de referir o exemplo de Moçambique e a região de Cabo Delgado, onde se desenrola atualmente uma enorme tragédia, com perda de vidas e violações sistemáticas dos direitos humanos3. É de lamentar profundamente que não só grande parte desse conflito gire em torno das reservas de gás da região, como que várias das maiores empresas portuguesas estejam ativamente a investir nesses recursos (cujo mercado de destino são nações asiáticas, via transporte marítimo de GNL) e talvez a contribuir para o agravar da situação4. Portugal tem aqui uma enorme responsabilidade histórica e deveria utilizar toda a sua influência diplomática e económica no sentido de terminar este conflito, em particular, e outros semelhantes. A atual presidência da União Europeia, que termina em final de junho, é uma oportunidade histórica para que o Governo português ajude a colocar a questão de Cabo Delgado no primeiro plano da agenda internacional. Uma Lei de Bases do Clima deveria incluir sólidas provisões de solidariedade internacional e justiça climática de forma explícita, alinhadas com os objetivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas.





Como conclusão, reafirmamos a defesa de uma transição justa e acelerada para alternativas limpas e sustentáveis à energia hoje proveniente do gás fóssil, e denunciamos a narrativa falsa e perigosa que pinta o gás como solução de transição.



Rio Maior, 25 de Março de 2021.

1 Howarth et al., “Methane and the greenhouse-gas footprint of natural gas from shale formations”, Climatic Science (2011), 106:679-690, DOI: 10.1007/s10584-011-0061-5.

2 Alfons Pérez, “Global Gas Lock-in: Bridge to nowhere”, ODG, Rosa-Luxemburg Stiftung, 2018.URL: https://www.rosalux.eu/en/article/1245.global-gas-lock-in-bridge-to-nowhere.html.

3 “Do Eldorado do gás ao caos”, Amigos da Terra França, Amigos da Terra Internacional e Justiça Ambiental Moçambique, Junho de 2020, URL: https://justica-ambiental.org/2020/06/16/do-eldorado-do-gas-ao-caos-quando-a-franca-empurra-mocambique-para-a-armadilha-do-gas/.

4 “New fóssil gas terminals – Profits over people”, Gasativists Collective, Leave it in the Ground, May 2019, Germany, URL: https://www.gastivists.org/wp-content/uploads/2019/05/New-Fossil-Gas-Terminals-Profits-over-People-Gastivists-LINGO-Report-2019.pdf.

quinta-feira, 18 de março de 2021

 

Patrocínios à Presidência Portuguesa do Conselho da UE: resposta ao Ministro Augusto Santos Silva

Há duas semanas, o Climáximo juntou-se ao Corporate Europe Observatory e à foodwatch para lançar uma campanha online exigindo o fim dos patrocínios de empresas à Presidência do Conselho da União Europeia, com foco nos patrocínios da atual presidência Portuguesa pela Delta Cafés, sumol+compal e The Navigator Company. As nossas críticas aos patrocínios acabaram por ser mencionadas num artigo do Politico, que foi depois reproduzido em muita imprensa nacional e acabou por provocar uma resposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, no Diário de Notícias a 11 de Março.

O Ministro diz que a decisão foi de reduzir os patrocínios “ao mínimo”. É impressionante que o resultado dessa redução tenha sido a escolha da Navigator Company. Esta empresa é acusada de usurpação de terras em Moçambique e é uma das maiores emissoras de gases com efeito de estufa em Portugal: o seu complexo industrial de Setúbal ficou no 5º lugar na lista de infraestruturas com as maiores emissões de CO2 no nosso país em 2017, de acordo com dados da Agência Europeia do Ambiente. Com o encerramento das centrais a carvão de Sines e do Pego e da refinaria de Matosinhos, a Navigator Company passa a ser a empresa com as maiores emissões de gases com efeito de estufa em Portugal, de acordo com o inventário de emissões recentemente divulgado pelo Climáximo e pela Greve Climática Estudantil.

O Ministro diz que os patrocínios não vão servir para alterar as políticas do Governo. Na verdade aqui concordamos. As políticas do governo, tal como as políticas da União Europeia, são sempre guiadas pelos interesses das empresas privadas. Nesse sentido, o logo da Navigator nos cadernos da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia não é mais que uma representação simbólica desta relação, que é o modo de operação habitual das instituições do poder político no capitalismo.

A relação entre os governos em Portugal e a Navigator é longa e bem conhecida, com quadros desta empresa a entrarem em diversos governos e desenhando a política florestal do país durante décadas. O resultado desta política é que 9% do território nacional está coberto de eucaliptos (um recorde mundial), contribuindo para o agravamento dos incêndios florestais, com consequências devastadoras em termos de perdas de vida humana e emissões dióxido de carbono.

O Ministro refere ainda a declaração da Navigator ao Politico, que diz que nenhum político entrou na empresa como diretor, nem um diretor da empresa entrou para o governo, desde a sua privatização no início dos anos 2000. Esta declaração é uma obra prima da ocultação dos factos, podemos talvez chamar-lhe uma “verdade cirúrgica”. Ao contrário do que dá a entender, a relação entre a empresa e o governo português mantém-se até aos dias de hoje. O exemplo mais recente é Tiago Martins de Oliveira, que foi responsável pelas áreas da Proteção Florestal (2008-2016) e da Inovação e Desenvolvimento Florestal (2016-2017) na The Navigator Company, sendo depois nomeado Presidente da Estrutura de Missão para a Instalação do Sistema de Gestão Integrada dos Fogos Rurais, cargo equiparado a Secretário de Estado, na dependência direta do Primeiro-Ministro do XXI Governo Constitucional, António Costa.

Para terminar, queremos também expressar o nosso acordo com o Ministro, quando diz que “vale a pena refletir” sobre o “relacionamento entre empresas e poderes”. Qualquer reflexão séria chegará à conclusão de que este relacionamento é diretamente responsável pelas décadas de inação em relação à crise climática e pelo falhanço de todos os acordos internacionais para a combater. Acabar com os patrocínios à Presidência do Conselho da UE não vai resolver o problema, mas é o mínimo que podemos fazer.


Setor da Aviação: Nem Justiça Nem Transição — Nota de Solidariedade Com os Trabalhadores da TAP e da Groundforce

O que está a acontecer na aviação não é uma transição justa. Nem sequer é uma transição. Assim, estamos em solidariedade com os trabalhadores da TAP e da Groundforce na defesa dos seus salários e postos de trabalho, reconhecendo a urgência de dialogarmos sobre a necessidade de uma transição rápida e justa neste setor.


Nas últimas semanas temos assistido a uma intensificação da luta dos trabalhadores da aviação, após todo o setor ter sido fortemente abalado pelo impacto da Covid-19. Desde os trabalhadores afetados pelo plano de reestruturação da TAP, que prevê cortes de salários entre 35 e 50% e rescisões amigáveis, aos trabalhadores da Groundforce que têm os seus salários em atraso e vêem o seu futuro ameaçado com a empresa em risco de insolvência, todo o cenário evidencia o forte desrespeito e negligência do Governo e empresários para com as pessoas que dão vida a este setor e que dele dependem.

A crise pandémica global causou uma redução forçada da aviação. Mas esta redução não está sequer enquadrada nas mudanças que têm que acontecer no setor para travar a crise climática. Pelo contrário, o Governo continua a querer construir um novo aeroporto, e continua a querer um aumento sem limites da aviação. Portanto, não só os trabalhadores estão a ser alvo de uma intensa injustiça, como não está a acontecer nem está planeada uma transição para o setor da aviação. Estamos a assistir precisamente ao oposto da transição justa que reivindicamos como o único rumo para travar o colapso climático dentro de um quadro de justiça social, que só pode ser construída com base num diálogo social com os trabalhadores, priorizando a sua proteção e garantindo emprego em setores não poluentes, como a ferrovia.

Assim, neste momento de profunda insegurança para os trabalhadores, famílias e comunidades afetadas por esta crise, declaramo-nos em solidariedade com a luta pela garantia dos meios de subsistência e da segurança de todos os trabalhadores. E afirmamos que nenhum plano concebido para lidar com a redução da aviação que não coloque no centro os trabalhadores e as comunidades afetadas pode ser adequado para lidar com os desafios que assolam o setor, e com os desafios colocados pela crise climática.


Para incentivar o debate e a construção de planos para uma transição justa na aviação, a Stay Grounded publicou o documento de discussão Uma Transição Rápida e Justa na Aviação, elaborado por pessoas ativas no movimento pela justiça climática, trabalhadores do setor da aviação, sindicalistas, comunidades indígenas e académicos de todo o mundo. Podes encontrá-lo em português aqui: Uma Transição Rápida e Justa na Aviação

Queres saber mais sobre o que é uma transição justa? Lê a nossa ficha informativa Transição Justa: O Que É? O Que Não É?

Radar Climático – 17 de Março

Mathias Cormann eleito secretário geral na OCDE, apesar do seu péssimo registo ambiental

Com o provável apoio de países como os Estados Unidos, o Canadá, o Reino Unido e a Polónia, este Australiano passou para a frente da organização intergovernamental. Para trás ficou a Sueca Cecilia Malmström.

A nomeação já foi contestada pelo movimento climático, dado Cornmann estar ligado a políticas como recusar a neutralidade carbónica, manter subsídios à indústria fóssil e ser uma força de bloqueio em fóruns internacionais.

 EDP vai pagar a António Mexia €800 mil por ano até 2023 

O afastamento de António Mexia da administração da EDP por um processo judicial tirou o gestor da estrutura da elétrica, mas este continuará a auferir rendimento desta: 800 mil euros por ano durante três anos, além de várias regalias.

A justificação foi dada em nome de “contrapartida da obrigação de não concorrência”. Já em 2020 Mexia auferiu um total, em termos brutos, de 2,37 milhões de euros.

Manso Neto também terá direito, durante três anos, a uma remuneração de 560 mil euros por ano e as mesmas regalias.

Estudo indica que a floresta da Amazónia está liquidamente a emitir GEE

Na primeira análise do tipo, feita por (parte de) mais de 30 cientistas, é dado como provável que, em termos líquidos, a Amazónia está a emitir Gases com Efeito de Estufa.

O aumento de temperaturas, secas e deflorestação estão a reduzir a capacidade da maior floresta tropical do mundo de absorver dióxido de carbono da atmosfera.

O dano ainda poderá ser revertido. Cortar nas emissões de combustíveis fósseis ajudaria a restaurar o equilíbrio, mas parar a desflorestação é crucial, tal como construir menos barragens e replantar árvores.

O inventário do Acordo de Glasgow em Portugal foi publicado

O documento afirma que Portugal tem até 2030 para cortar 74% das emissões nacionais de GEE. O Acordo de Glasgow vai mais longe que o Acordo de Paris e diz que as emissões globais têm de cair para as 32,6 gigatoneladas de CO2 equivalente (sendo que em 2019 o nível de emissões recorde foi de 59,1 gigatoneladas).

O primeiro inventário de emissões desagregadas de GEE no país, revela as mais de 250 infraestruturas responsáveis pelas maiores emissões. Segundo dados de 2018, os setores mais poluentes em Portugal são o dos Transportes, seguido da Energia, Indústria, Agricultura, Florestas, Pecuária e Pescas e Resíduos.

Segundo Antónia Seara, ativista da Greve Climática Estudantil “será agora criado um plano de ação, em conjunto com várias organizações pela justiça climática e social, que, tendo como base este inventário, permita cortar 74% das nossas emissões até 2030, garantindo que fiquemos abaixo dos 1,5ºC de aquecimento global até 2100″.

A portuguesa Etermar vai construir terminal petrolífero do segundo maior porto do Senegal

Etermar Engenharia e Construção, a maior empresa portuguesa especializada em construção marítima, ganhou o projeto para construir o terminal de hidrocarbonetos do Porto de Bargny-Sendou no Senegal, o segundo maior porto do país, 25 quilómetros a Sul de Dakar.

O terminal de granéis líquidos poderá receber navios com capacidade até 95 mil DWT e irá permitir a importação e exportação de hidrocarbonetos do país. A obra deverá estar concluída no final de 2021.

Em Portugal esta empresa é líder nos consórcios responsáveis pelas Dragagens da Ria de Aveiro, do Canal de Acesso aos Estaleiros de Viana do Castelo e venceu recentemente com a Mota-Engil o concurso para a ampliação do Terminal XXI em Sines. 

No Japão assinaram-se 10 anos desde o desastre de Fukushima

Este teve origem num tsunami que além de desencadear o desastre nuclear da central nuclear de Fukushima ainda matou diretamente mais do que 18.000 pessoas.

Hoje mais de 40.000 pessoas não podem regressar a casa, especialmente perto de Fukushima Daiichi, onde o triplo derretimento nuclear forçou à evacuação imediata de 160.000 pessoas. O trabalho complexo de localizar e remover o combustível nuclear ainda mal começou, demorará pelo menos 40 anos e custará milhões.

A decisão do que fazer com água contaminada guardada em mais de 1000 tanques ainda é desconhecida, supondo-se que a capacidade destes esgotar-se-á no outono de 2022.

Ativistas da Greenpeace aterram no telhado do BCE em protesto contra as más políticas climáticas

Dois ativistas da Greenpeace pousaram de parapente, na passada quarta-feira, no telhado de um dos edifícios do Banco Central Europeu, em Frankfurt, numa ação que pretende denunciar a recompra de dívida – Quantitative Easing – de empresas que exploram combustíveis fósseis.

A recompra de dívida privada, inclui a aquisição de 300 mil milhões de euros em títulos emitidos por mais de 60 empresas baseadas em combustíveis fósseis, entre as quais a Shell, a Total, a Eni, a OMV e a Repsol.

Isto surge no contexto do BCE ter lançado, no ano passado, um programa de recompra de grandes dívidas, principalmente públicas, mas também privadas, para apoiar a atividade económica da zona do euro, gravemente abalada pela pandemia de covid-19.

Centenas de trabalhadores da Groundforce manifestaram-se em Belém pelos salários

Os trabalhadores da Groundforce não recebem os seus salários na íntegra desde fevereiro. Pedem que o acionista maioritário, Alfredo Casimiro, da Pasogal, aceite a proposta que a TAP lhe fez no domingo, de um aumento de capital de 6,97 milhões de euros – aumentando a participação da TAP na empresa – que permitiria pagar os salários aos 2.400 trabalhadores. 

Adicionalmente, estes convocaram uma manifestação para a próxima/esta quinta-feira às 11:00 no Aeroporto.

segunda-feira, 15 de março de 2021

Publicado em: Jornal Comercioenoticias


Hoje, 15 de março, mais de 450 associações, coletivos e ONGs de todo o mundo juntaram-se para formar a Aliança “Não ao Acordo UE-Mercosul”.

Organizações como a Greenpeace, a Fridays for Future, ou a REBRIP, querem travar a aprovação de um acordo comercial que dizem ameaçar “a ação climática, soberania alimentar, defesa dos direitos humanos e do bem-estar animal”.

O acordo entre a União Europeia e a Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai seria o maior acordo comercial envolvendo a União Europeia, abrangendo um total de 780 milhões de consumidores.

As negociações tiveram início em 1999 e o acordo foi assinado em dezembro de 2019, faltando ainda ratificá-lo. O processo de ratificação do acordo pode ter lugar durante o mandato da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, que teve início em janeiro.

A Aliança, contudo, apresenta as suas preocupações face às consequências ambientais e económicas do acordo, afirmando que o mesmo “incentivará ainda mais a destruição e o colapso da biodiversidade da Amazónia, do Cerrado e do Gran Chaco devido à expansão das cotas pecuárias e de etanol, perpetuando um modelo extrativista de agricultura exemplificado pelo sobrepastoreio (uso intensivo do solo que leva à sua degradação), expansão de confinamentos pecuários de monoculturas quimicamente intensivas. Abusos de direitos humanos são parte intrínseca das cadeias de produção visadas no acordo. Assiná-lo daria um forte sinal político de que tais abusos hediondos são aceitáveis”. Além das questões ambientais que preocupam Mariana Jesus, da Greve Climática Estudantil, a ativista encontra outros riscos neste acordo, nomeadamente no que diz respeito à fiscalização deficitária em matéria de bem-estar animal e segurança alimentar: "É a nossa saúde que está em risco com este acordo mas não só, o bemestar destes animais também!”

Em alternativa, a aliança de organizações afirma que, “para um futuro viável, um modelo de comércio do século 21 deve apoiar, em vez de minar, os esforços para criar sociedades socialmente justas e ecologicamente resilientes, baseadas nos princípios de solidariedade, proteção dos direitos humanos e de nossos limites planetários.”

Após forte pressão da sociedade civil, vários Estados-Membros - como a Áustria, França, Bélgica e Luxemburgo - e o Parlamento Europeu expressaram as suas preocupações, e o processo de ratificação está em suspenso. A Comissão Europeia está a conduzir discussões com países do Mercosul sobre "condições de pré-ratificação", o que poderá eventualmente resultar num protocolo adicional ao acordo. Mas a Aliança argumenta que um protocolo adicional ou uma declaração não resolveria nenhuma das questões levantadas pelo acordo, uma vez que o texto do acordo não mudaria. O capítulo sobre Comércio e Desenvolvimento Sustentável (TSD), por exemplo, continuaria a ser aspiracional e não exequível. "Os objetivos e elementos centrais deste acordo estão em oposição directa à justiça social, criação de emprego, ação climática, soberania alimentar e defesa dos direitos humanos e bem-estar animal. Nos momentos em que a UE está a adotar o Acordo Verde, este acordo deve ser travado.", diz Tânia Santos da TROCA - Plataforma por um Comércio Internacional Justo, acrescentando que “de acordo com o estudo de impacto encomendado pelo governo holandês, o acordo vai ter um impacto negativo na generalidade dos salários na UE”.

A Rede STOP UE-Mercosul Portugal, um conjunto de 18 coletivos que incluem a Greve Climática Estudantil, a Quercus e o Coletivo Andorinha, afirma que o acordo UE-Mercosul é um perigo para o planeta, para as pessoas, para a saúde e soberania alimentar. Estas razões levam a rede nacional a integrar a aliança internacional.

Gisele Fernandes, do Coletivo Andorinha, que também integra a rede, refere um inquérito realizado pela YouGov que apresenta a população portuguesa como a mais oposta ao acordo entre os países europeus estudados: “verifica-se uma contradição em Portugal, grande parte da população, 85%, é contra o acordo; e o governo português, pelo contrário, é o seu maior defensor”.

No dia 20 de maio terá lugar uma reunião dos Ministros do Comércio onde essa e outras questões deverão ser discutidas, não sendo ainda claro se será essa a data da votação da ratificação deste acordo no Conselho da UE.

 

Tirar o pulso ao capitalismo fóssil para travar o colapso – João Camargo

As organizações portuguesas do Acordo de Glasgow construíram um quadro que nos permite ver como a crise climática é gerada no nosso próprio país. A partir do inventário desagregado de emissões de gases com efeito estufa em Portugal, que pode ser consultado aqui, é possível começar um processo mais amplo de discussão sobre a crise climática e a sua solução. Hoje temos uma visão mais clara de como a economia é viciada em combustíveis fósseis, quais as principais infraestruturas emissoras, os responsáveis e as loucuras futuras que é necessário travar.

Compilando dados de fontes oficiais, Greve Climática Estudantil e Climáximo criaram o inventário que explicita com elevado nível de detalhe a maneira como se distribuem as emissões em Portugal. Esta é uma ferramenta que está a ser desenvolvida em mais de 40 países que têm representantes no Acordo de Glasgow.

Em termos da informação contida no inventário, é relevante que, com os encerramentos da centrais a carvão do Pego e de Sines e da refinaria de Matosinhos, hoje a principal infraestrutura emissora em Portugal é a refinaria de Sines da Galp (que, com o encerramento de Matosinhos, ainda aumentou mais as suas emissões). O sector dos transportes torna-se o principal sector emissor, com um peso desmesurado da componente rodoviária (carros, camiões, autocarros). As indústrias das celuloses e das cimenteiras ganham muitas posições nos lugares cimeiros, enquanto no sector elétrico hoje são as centrais a gás as principais emissoras. Em termos de empresas, as principais emissoras em Portugal são a hoje The Navigator Company, Galp, EDP, TAP, CIMPOR, Europac, Turbogás, Secil, Repsol e Carnes Landeiro. Mais de 250 infraestruturas estão identificadas no inventário.

O inventário abrange uma área que também fica sempre fora dos inventários oficiais: os projectos futuros que acarretam aumento de emissões de gases com efeito de estufa. Em Portugal, o caso mais clamoroso é a ideia negacionista de construção de um novo aeroporto para Lisboa, mas outros projectos como a construção de um gasoduto, expansões dos portos de Sines, Lisboa, novas ligações rodoviárias e projectos de mineração de grande extensão estão identificados.

A resolução da crise climática não é uma abstração e a sua resolução também não o é. Apesar do crescente engano promovido quer por governos, que por empresas, nomeadamente a inflação dos sumidouros de carbono, a falácia dos offsets de carbono e o grande chapéu da “neutralidade carbónica”, a questão é que a única maneira de resolver a crise climática é cortando emissões. A impotência ou rejeição por parte das instituições, governo e empresas em resolver a crise climática ficou (ainda mais) clara no recente relatório das Nações Unidas: as propostas dos governos deveriam perfazer um corte de emissões globais de 50% até 2030 em relação às emissões de 2010, mas actualmente ficam-se por um corte de 1%. Aceitar isto como uma inevitabilidade não é realpolitik nem é pragmatismo, é pulsão suicida. O colapso climático não é “destruição de valor” ou “perdas económicas”, é a destruição da base material que permite a existência de civilização.

Para resolver a crise climática é importante falar da maneira menos abstracta possível, abandonar balanços relativos e falar das fontes das emissões. Nesse aspecto, este documento tira o pulso ao capitalismo fóssil português, e a todas as grandes fontes de emissões que garantem a persistência e o agravar da crise. Este raio-X do nosso país permite conhecer a realidade sobre a qual é preciso actuar com a máxima urgência, com a urgência de travar, em articulação com outros movimentos por todo o mundo, o colapso. Só desagregando a monstruosidade do capitalismo fóssil nas suas diferentes componentes é que podemos perceber como é que se trava o colapso climático.

Este quadro do capitalismo fóssil em Portugal é o pontapé de partida para um processo mais alargado de construção de um plano social para realizar o necessário corte de ¾ das emissões nacionais nos próximos nove anos, para construir uma agenda pela Justiça Climática. É esse o passo seguinte do Acordo de Glasgow em Portugal, e começa agora.


Artigo originalmente publicado no Expresso a dia 15 de Março de 2021.

sábado, 13 de março de 2021

 

VACINA COVID19
ACESSO UNIVERSAL E JUSTO

Nós, abaixo-assinado, fazemos este apelo conjunto a todos os líderes globais, organizações internacionais e governos, para que adotem medidas legais e tomem posições oficiais, declarando as vacinas COVID-19 como um Bem Comum Global, livre de qualquer direito de patente pertencente a qualquer pessoa.

Os signatários abaixo indicados, somam-se em Portugal, às várias iniciativas neste contexto, nomeadamente a que foi iniciada pelo Prof. M. Yunus e que inclui vários laureados do Prémio Nobel, líderes da sociedade civil e outros líderes mundiais.

para assinar: www.vacinaparatodos.pt/index.php/pt/vacinaparatodos

quinta-feira, 11 de março de 2021

CONHECER O OUTRO... - Manuela Marques

Quando crescemos internamente, desenvolvemos capacidades impensáveis enquanto a maturidade não se manifesta.

Conhecer alguém passa a ser uma actividade gostosa mas reverente, como se pisássemos terreno sagrado do outro – um lugar de vivências, povoado de afectos, os que se manifestaram algum dia ou os que ainda fazem sorrir de ternura.

Os passos devem ser cautelosos para conhecer as marcas do tempo, as cicatrizes do corpo e daquilo a que se chama alma.

Entrar no outro é pedir licença para as ante-câmaras da consciência, é estar preparado para vibrar gargalhadas e lágrimas – até as que provavelmente nunca ninguém percebeu.

Detectar gostos, mesmo os inconfessáveis, as raivas descompensadas, os sorrisos estáticos de gioconda, o sentido de humor intermitente a picar conversas que poderiam ser dramáticas, o desejo de ser entendido, a necessidade de estar só de vez em quando…

Todos somos seres misteriosos, apetecíveis, enormes no potencial.

Todos somos revestidos a camuflados defensivos, sociais, ensaiados para iludir a essência a preservar.

Deixar-se entrelaçar pelo outro é incómodo. Quebrar as protecções, aparecer nos verdadeiros contornos do nosso ser, como uma nudez tardia, indesejada, só é possível pela curiosidade da aventura de criar outra entidade - O nós.

Caminhar pelo outro, fundir apetites, rejeições, emprestar o olhar ao outro para que nos seja devolvido acrescentado…

Alquimias de andarilhos pelo caminhar dos dias – cruzamentos de trajectórias a deixar em aberto traçados por descobrir… a grande aventura de VIVER!

MMM

segunda-feira, 8 de março de 2021

Emissões: afinal quanto é que Portugal tem de cortar? - João Camargo

A neutralidade carbónica e as promessas de emissões “net zero” são truques utilizados por governos e empresas para justificar aprovar aumentos de emissões, com as petrolíferas a indicarem que querem continuar a aumentar a produção de combustíveis fósseis. Passaram de negacionistas a ilusionistas.

Tem ganho espaço mediático a ideia de que devemos procurar a “neutralidade de carbono” como eufemismo para evitar dizer que temos de cortar uma fatia gigante das emissões de gases com efeito de estufa para evitar ultrapassar 1,5ºC até 2100, como prevê o aclamado Acordo de Paris. Esta neutralidade, e o famoso “net zero”, acoplados a uma enorme dispersão de datas, criam um ambiente público de enorme incerteza sobre o que é que deve ser feito. Mas, afinal, quanto é que nós temos de cortar mesmo?

Começando pela melhor ciência disponível, o relatório de 2018 do IPCC, ficamos a saber que para evitar um aumento de temperatura média global de 1,5ºC até 2100, é necessário cortar entre 40 e 60% das emissões globais de gases com efeito de estufa até 2030, comparando com os níveis de 2010, o que em geral é indicado como um corte de 50% das emissões à escala global. Um relatório recente das Nações Unidas aponta que, ao contrário dos 50% de cortes, a soma das propostas dos países de todo o mundo apenas chega a 1% de cortes até 2030.

Os conceitos de neutralidade de carbono e/ou “net zero” implicam um aumento da capacidade de absorção dos gases com efeito de estufa, geralmente a cargo de florestas, solos, oceanos e zonas húmidas. Em que medida é que estes conceitos servem para camuflar truques? Esta capacidade de absorção é exagerada nos inventários nacionais, a própria capacidade de absorção está a reduzir-se com o aumento da temperatura média global, e não há uma fórmula mágica para multiplicá-la. Apesar da conversa ridícula por parte de grandes emissores, de que a plantação de uma área equivalente à Índia com espécies florestais evitaria a redução drástica das emissões, as limitações são evidentes: onde está essa área vazia para ser plantada? Como seria instalada essa floresta, que aumento de emissões estaria associado a essa instalação? Como se garantiria que a mesma plantação não destruía outros habitats? Como é que a mesma não arderia em grande escala com o aumento da temperatura geral? No fundo, é uma ideia tão simples que simplesmente não funciona, porque a sua simplicidade baseia-se na ignorância das condições básicas e logísticas para a sua exequibilidade. Pelo contrário, há uma redução da área florestal à escala global, e em particular de florestas mais antigas e de importância global, como a Amazónia e a tundra.

Insiste-se na ideia de que existe uma tecnologia chamada “Captura e Armazenamento de Carbono”, uma engenhoca que retiraria dióxido de carbono e metano da atmosfera. Não existe. É mais um truque no qual se despejam milhares de milhões de euros anualmente para evitar o urgente e necessário corte de emissões.

Finalmente, associados às ideias anteriores, uma derradeira fórmula mágica, estão os “offsets” de carbono, que compensariam as emissões de gases com efeito de estufa com plantação ou conservação de florestas noutros locais. Com as petrolíferas a correr a prometer emissões “net zero” para não terem de cortar emissões e poderem manter o seu negócio como sempre, já prometeram plantar mais área do que aquela que há disponível no mundo. Portanto, quando os publicitários da BP dizem que pode abastecer ali que eles ‘compensam’ as emissões com florestas no outro lado do mundo, isso não é só publicidade, é mentira.

A neutralidade carbónica e as promessas de emissões “net zero” são truques utilizados por governos e empresas para justificar aprovar aumentos de emissões, com as petrolíferas a indicarem que querem continuar a aumentar a produção de combustíveis fósseis. Passaram de negacionistas a ilusionistas.

Sobre as promessas oficiais, os governos utilizam ainda outros truques, nomeadamente mudando a escala temporal. Uns prometem cortar 50% das emissões até 2050, outros cortar 50%, mas em relação a 1990 ou 2005 (altura em que as emissões eram mais altas, o que garante um corte menor), outros prometem cortar 30% das emissões, e por aí fora. As modalidades são várias, mas nunca o corte apontado pela ciência: um corte de 50% das emissões globais em 2030, comparando com o nível de 2010.

Quanto é que têm, então, os países de cortar em emissões e quanto é que Portugal tem de cortar? A resposta é composta, como sempre, pela nossa visão do mundo. Há gente que olha para o mundo como se não tivesse havido História, achando que, por exemplo, Moçambique e os Estados Unidos têm o mesmo nível de responsabilidade histórica pela crise climática. Nesse caso, defenderiam que ambos tinham de cortar 50% das emissões. A injustiça preconizada em tal visão diz quase tudo o que temos de saber acerca dessas pessoas. Sob uma perspectiva de justiça climática, integrando através de um mecanismo mainstream de equidade (que não é um termo tão avançado quanto justiça), o Paris Equity Check, Portugal tem de cortar 74% das suas emissões, comparando o nível de 2030 com o de 2010. Isto significa que, em 2030, Portugal deverá poder emitir apenas cerca de 19 megatoneladas de dióxido de carbono equivalente. Em 2018 emitiu 68. Realizar este corte é a nossa tarefa civilizacional. Se a floresta também se puder expandir e ser beneficiada além disso, será sempre um bónus e margem de segurança relativa para a ameaça existencial em que estamos metidos.

Originalmente publicado no Expresso a dia 4 de Março de 2021