«Quando os ricos fazem a guerra, são os pobres que morrem».
(Jean-Paul Sartre)
Sem ódio sem ópio
vou mostrando uma tristeza passada, um
original remorso A raiva viaja-se,
oh turistas do mar. Os gatos burros assobiam
por cima da água, enquanto as pedras
movem-se dentro de casa, partem espelhos
ao luar. Ardem bandeiras.
O circo quer comover a província. E
onde o homem desapareceu
onde o macho nunca dormiu
- está o cheiro alfacinha do gato
as matinais nuvens trepadeiras.
Mas as cidades de Março avançam frementes
procuram o retrato viril da natureza
os duros seios. Espero o jornal na
manhã capada: o crime dos lábios roubados;
a serpente dentro do púcaro;
a furgoneta do Diabo.
Eu, construtores de pirâmides
defendo a baba violenta do violino
o cravo amargo os lenços o amor sem ranço
contra a samarra, o sarro. E assim descubro
a cor grácil
a cabra violada entre as estevas o sino bom
o bode a faca a pata VERDE
o rabo ao alto em forma de pino.
Sem ócio sem BÓCIO
cuspo em tortos pactos: não aceito
na margem do pântano o eterno pânico;
mudo de NUVEM, o nariz é outro
MUDO de medo constantemente.
Para sermos francos, felizes e naturais
é preciso mudar também os lugares
as suas buzinas sinistras
os beijos a ruminar dentro dos sítios.
Mas
defendei-vos, camaradas: desconfiai dos burgueses
compradores de ARMAS.
Praia da Adraga - Maio de 1975
Fernando Grade, QUEM DIZ MACHO DIZ FÊMEA, Edições Mic, Colecção Salamandra/2, 1982, pp 35/6
Foto: http://amadeubaptista.blogspot.com/2014/04/fernando-grade.html