domingo, 28 de maio de 2023

Manifesto – Por um Serviço Público de Energias Renováveis

O acesso à energia é um direito básico que está altamente ameaçado pela crise climática, assim como pelo atual sistema energético, movido pela ótica de maximização de lucros e expansão energética e de capital. 

A mercantilização dos recursos energéticos, e a privatização e liberalização do mercado de energia não só têm levado a um aumento dos preços de venda de energia aos consumidores, a um aumento da pobreza energética, a uma redução dos empregos no setor e da sua qualidade e segurança, como também resultaram num investimento insuficiente e desajustado em energias renováveis.

Isto aconteceu par-a-par do não cumprimento das reduções de emissões necessárias para assegurar um planeta habitável e duma expansão do setor energético. Esta expansão, apesar de incluir um aumento da produção e investimento em energias renováveis, continua a colocar o interesse das empresas energéticas em primeiro lugar, impondo altos preços aos consumidores – apesar do preço de produção das energias renováveis ser significativamente menor que o de geração de energias fósseis – e não assegurando acesso universal a energia. Tal aconteceu porque este investimento seguiu um modelo produtivo e de gestão inadequado e incompatível com os interesses públicos e a necessidade de travar a crise climática, investimento esse que muitas vezes foi conduzido pelas mesmas empresas que continuam a expandir as suas emissões.

A situação atual que vivemos de crescente pobreza e inflação causadas por um aumento injusto dos preços dos combustíveis fósseis reflete bem a incompatibilidade do sistema atual com metas de justiça climática e social. Ao mesmo tempo que os preços da energia disparam – e por consequência se observa um aumento generalizado dos preços que resulta de uma economia altamente dependente de combustíveis fósseis – a indústria fóssil e energética regista lucros recorde e anuncia novos investimentos em combustíveis fósseis. Estes investimentos não só comprometem a nossa existência neste planeta, como também metas de segurança energética e justiça social. 

A descarbonização da nossa economia e a eletrificação dos diversos serviços e processos essenciais – agora dependentes do uso de combustíveis fósseis – é urgente para evitar o aumento catastrófico das temperaturas médias globais.

O investimento no setor energético tem de estar alinhado com objetivos e políticas que assegurem uma transição energética justa e com os prazos ditados pela ciência climática, assim como políticas que garantam acesso universal a energias renováveis e pleno emprego com direitos. Isto implica políticas que garantam coordenação ao longo de toda a cadeia de produção, e protegendo o sistema energético de mercados instáveis e injustos.

Reconhecemos que todos os métodos de captura, armazenamento, transformação, e distribuição de energia comportam certo nível de disrupção e impacto ambiental. É por isso essencial um planeamento democrático para o setor que garanta o alinhamento com políticas públicas de cariz social e ambiental, e respeite a soberania e democracia energética das comunidades.

O sector privado pode ser incentivado e subsidiado de forma a estimular o investimento em energias renováveis e numa transição justa. Contudo, face à necessidade clara de investimento público para assegurar uma transição energética em tempo útil e justa, acreditamos fazer muito mais sentido que o dinheiro público seja investido na ótica do bem comum para criar serviços públicos livres da lógica dos mercados e do lucro. Para além disso, as instituições, depois de nacionalizadas e de novo na esfera pública, se geridas de forma democrática e segundo princípios de equidade e justiça, estão muito mais bem capacitadas para dar resposta à urgência das alterações climáticas, enquanto protegendo os direitos e interesses dos trabalhadores e da sociedade em geral.

Acesso seguro e universal a energias renováveis apenas pode ser garantido através de um serviço público movido pelos interesses comuns, que ofereça empregos de qualidade a todos os que trabalham no setor, e de controlo democrático. Um sistema de energias renováveis de propriedade pública pode estabelecer e expandir a capacidade de controlo e planeamento democrático sobre o mesmo. Este será um serviço-chave não só para travar a crise climática, mas também para enfrentar de forma consistente problemas de natureza social que afrontam a nossa sociedade como a pobreza, desigualdade e insegurança social.

Por estas razões, os subscritores deste manifesto, escrito pelo Grupo de Trabalho Energia Pública Renovável da campanha Empregos para o Clima, defendem a urgência da criação de um Serviço Público de Energias Renováveis.