segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Saiba como baixar a sua conta da eletricidade – João Reis

O título deste artigo não é clickbait, vou mesmo ensinar-lhe uma forma de baixar o seu preço da luz. Nesta altura estará a perguntar-se: qual é o truque? Existe um truque de facto, ou melhor dois truques.

O primeiro truque passa por investir em energias renováveis. Agora segue a pergunta: energias renováveis? Mas essas coisas não servem para subir a conta da luz?

Longe vão os dias em que as energias renováveis representavam um fardo nas contas. Na última década, o custo da eletricidade a partir de fontes como o solar e eólicas caiu a pique. Ainda antes da escalada dos preços de gás, petróleo e carvão do último ano, as renováveis já eram uma fonte de poupança.

A fatia que estas representam nos sistemas elétricos é cada vez maior. A nível mundial, as renováveis já produzem mais eletricidade do que o gás, e prevê-se que nos próximos anos superem o carvão. Em Portugal, as fontes hídricas têm um longo histórico, as eólicas já são uma parte essencial do setor energético e a solar caminha para tal.

Apesar disso, tem sido difícil alguém olhar para a conta da luz e perceber o papel que as renováveis têm em baixá-la. Em especial com o vigente “modelo marginal” de fixação preços, em que a fonte de energia mais cara (isto é, o gás) empurra para cima todos os preços.

Como ilustrado pelo atual mecanismo de preços, mesmo com a crescente presença das renováveis, as grandes energéticas têm continuado a lucrar desmesuradamente com a produção elétrica. Enquanto extorquir o consumidor comum de energia continuar a ser uma possibilidade, as grandes empresas irão procurar formas de o fazer. Apesar das conversas a nível europeu para uma mudança do sistema de preços, é difícil vislumbrar mais do que uma mudança cosmética.

É este ponto que nos leva ao segundo truque: o setor energético passar a servir o interesse público e não o das grandes empresas.

É crucial que esta seja uma transição rápida para as renováveis, não uma transferência gradual na qual permanece intacta a moldura em que as empresas do costume continuam a extrair lucros colossais. Olhando para o setor petrolífero, quer em Portugal no caso da Galp que quase duplica os lucros, quer pelo mundo fora, os lucros dos últimos meses atingiram níveis que são insultuosos para quem sofre com crise do custo de vida. Como se não bastasse, as multinacionais estão a investir esses mesmo lucros em expandir a produção de combustíveis fósseis, assegurando que continuaremos a depender dessas fontes não renováveis por muitas mais décadas.

A passagem para as renováveis não é trivial. A intermitência, a dispersão e a necessidade de eletrificação colocam desafios que têm de ser superados com investimentos em transmissão, armazenamento e eletrificação, mas ao contrário do que é frequentemente afirmado, não dependem de milagres tecnológicos.

Para grande parte dos consumos, as tecnologias já existem, e a viabilidade de sistemas baseados em energias renováveis é consensual.

Os desafios da transição energética tornam ainda mais vital que o interesse público a conduza, não deixando aspetos cruciais à mercê dos mercados, cuja derradeira necessidade é a procura do lucro. Uma transição energética que se traduza em acesso universal a energia para todas as pessoas, através da criação de um serviço público de energias renováveis, que garanta uma transição justa para os trabalhadores dos setores poluentes, e que crie milhares de Empregos para o Clima dignos e de qualidade, é possível, e é o plano para baixar as contas.

Passar para um sistema de energias renováveis a preços suportáveis é possível, mas para o conseguir, o truque é mesmo pôr mãos à obra e não deixar os lucros esvaziarem os bolsos dos do costume.