sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

O LEGADO ISLÂMICO EM PORTUGAL - Cláudio Torres e Santiago Macias

O Legado Islâmico nos Territórios do Gharb


SANTARÉM


A cidade de Santarém (a antiga Scalabis romana) domina a imensa campina ribatejana, o antigo território de Batala, desde sempre referida e louvada pelos cronistas. O sistema de cultivo destes terrenos, ciclicamente inundados pelo rio, foi comparado por al-Himyari, como já antes se referiu, ao que se praticava no Nilo.

A zona áulica da cidade está implantada sobre uma plataforma natural, situada cem metros acima do rio Tejo, que corre a seus pés. A cidade em si é ainda mal conhecida no que se refere ao período islâmico. Al-Idrisi, para além de referir as vantagens defensivas do seu posicionamento, afirmava que a cidade não tinha muralhas, referindo-se naturalmente à Ribeira que seria nessa altura o casco urbano mais importante.



CAPITÉIS DA ÉPOCA ISLÂMICA


Hoje conservados em São João de Alporão, estes três capitéis, referenciados desde finais do século XIX (um deles foi desenhado por Zeferino Brandão no livro Monumentos e Lendas de Santarém), são atribuíveis às épocas califal (dois deles) e almorávida. Os mais antigos encontraram-se na zona de Alporão e são peças finamente lavradas, onde uma progressão do geometrismo se começa a fazer sentir. A origem clássica sente-se ainda na evolução das volutas jónicas e das folhas de acanto. O ábaco, porém, começa a ser ocupado por complexa laçaria abstractizante. Esta evolução permite-nos propor o seu enquadramento numa fase pós-califal, sendo provável que sejam obra da segunda metade do século XI ou mesmo depois disso. Tendo em conta as cartelas epigrafadas com invocação religiosa, estes capitéis devem ter pertencido a uma mesquita, da qual resta este testemunho apenas.

Santarém organizar-se-ia, aparentemente, em três núcleos bem diferenciados. A alcáçova, certamente muralhada, que tinha três portas, prolongava-se até à zona de São João de Alporão. A oeste, e junto ao Tejo, estavam já implantados os arrabaldes da Ribeira e do Alfange.

A cidade terá mantido em época islâmica um importante núcleo de população moçárabe, sendo sintomática a manutenção do nome paleocristão (Sancta Irena » Xantarin) ao longo de todo o período islâmico.


Nota: os capitéis referidos encontram-se no Museu de São João de Alporão.


Transcrito de: O LEGADO ISLÂMICO EM PORTUGAL, Cláudio Torres e Santigo Macias, Círculo de Leitores, pp. 106-109.