sábado, 26 de fevereiro de 2022

POESIA É CULTURA E INSUBORDINAÇÃO.


                    COMEMORAMOS OS 89 ANOS DO NASCIMENTO DE  RUY BELO 

 

Nos idos de 1933 deram-se acontecimentos que tiveram consequências  catastrófica e sangrentas a nível planetário. Por exemplo: a burguesia, em particular os banqueiros, os grandes industriais alemães e os partidos que representavam os seus interesses apoiaram a ascensão dos nazis ao poder - impondo a nomeação de Hitler para Chanceler; e, em Portugal é institucionalizada a ditadura fascista (Estado Novo), através de um plebiscito fraudulento.

Nesse mesmo ano, na freguesia de S. João da Ribeira, concelho de Rio Maior, nasceu a 27 de Fevereiro Rui de Moura Ribeiro Belo. O poeta Ruy Belo deixou-nos, apesar da sua morte prematura, uma obra poética de grande valor mas também, em letra de forma, a sua própria definição do papel da poesia e do poeta, como o demonstra o texto que passamos a transcrever:

 

BREVE PROGRAMA PARA INICIAÇÃO AO CANTO

 

Ao escrever, e independentemente do valor do que escrevo, tenho às vezes a vaga consciência de que contribuo, embora modestamente, para o aperfeiçoamento desta terra onde um dia nasci para nela morrer um dia para sempre. Dou palavras um pouco como as árvores dão frutos, embora de uma forma pouco natural e até antinatural porquanto, sendo como o é a poesia uma forma de cultura, representa uma alteração, um desvio e até uma violência exercidas sobre a natureza. Mas, ao escrever, dou à terra, que para mim é tudo, um pouco do que é da terra. Nesse sentido, escrever é para mim morrer um pouco, antecipar um regresso definitivo à terra. 

Escrevo como vivo, como amo, destruindo-me. Suicido-me nas palavras. Violento-me. Altero uma ordem, uma harmonia, uma paz que, mais do que a paz invocada como instrumento de opressão, mais do que a paz dos cemitérios, é a paz, a harmonia das repartições públicas, dos desfiles militares, da concórdia doméstica, das instituições de benemerência. Ao escrever, mato-me e mato. A poesia é um acto de insubordinação a todos os níveis, desde o nível da linguagem como instrumento de comunicação, até ao nível do conformismo, da conivência com a ordem, qualquer ordem estabelecida.

O poeta deve surpreender-se e surpreender, recusar-se como instituição, fugir da integração, da reforma que até mesmo pessoas e grupos aparentemente progressivos lhe começam subtilmente a tentar impor o mais tardar aos trinta anos. Abaixo o oportunismo, a demagogia, seja a que pretexto for. O poeta deve desconfiar dos aplausos, do êxito e até passar a abominar o que escreveu logo depois de o ter escrito. Numa sociedade onde quase todos, pertencentes a quase todos os sectores, procuram afinal instalar-se o mais cedo possível, permanecer fiéis à imagem que de si próprios criaram pessoalmente ou por interpostas pessoas, o poeta denuncia-se e denuncia, introduz a intranquilidade nas consciências, nas correntes literárias ou ideológicas, na ordem pública, nas organizações patrióticas ou nas patrióticas organizações.

Escrever é desconcertar, perturbar e, em certa medida, agredir. Alguém se encarregará de institucionalizar o escritor, desde os amigos, os conterrâneos, os companheiros de luta, até todas aquelas pessoas ou coisas que abominou e combateu. Acabarão por lhe encontrar coerência, evolução harmoniosa, enquadramento numa tradição. Servir-se-ão dele, utilizá-lo-ão, homenageá-lo-ão. Sabem que assim o conseguiram calar, amordaçar, reduzir.

É claro que falo do poeta e não do poetastro, do industrial e comerciante de poemas, do promotor da venda das palavras que proferiu. Falo do homem que nunca repousou sobre o que escreveu, que se recusou a servir-se a si e a servir, que constantemente se sublevou.

Falo do homem que, ombro a ombro com os oprimidos, empunhando a palavra como uma enxada ou uma arma, encontrou ou pelo menos procurou na linguagem um encontro para o silêncio que há no vento, no mar, nos campos.

O poeta, sensível e até mais sensível porventura que os outros homens imolou o coração à palavra, fugiu da autobiografia, tentou evitar a todo o custo a vida privada. Ai dele se não desceu à rua, se não sujou as mãos nos problemas do seu tempo, mas ai dele também se, sem esperar por uma imortalidade rotundamente incompatível com a sua condição mortal, não teve sempre os olhos postos no futuro, no dia de amanhã, quando houver mais justiça, mais beleza sobre esta terra sob a qual jazerá, finalmente tranquilo, finalmente pacífico, finalmente adormecido, finalmente senhor e súbdito do silêncio que em vão tentou apreender com as palavras, finalmente disponível não já tanto para o som dos sinos como para o som dos guizos e chocalhos dos animais que comem a erva que afinal pôde crescer no solo que ele, apodrecendo, adubou com o seu corpo merecidamente morto e sepultado.

Em: Ruy Belo - Todos os Poemas, Círculo dos Leitores, 2000, pp. 267/8.

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De dia 02 de abril a dia 16 de abril a Grande Caravana Pela Justiça Climática vai pôr os pés à estrada. 


\\ Podes ver toda a informação em caravanaclima.pt 
\\ Inscreve-te e descobre como te podes envolver aqui 


A crise climática é o tempo das nossas vidas. Enquanto empresas e governos repetem fórmulas esgotadas para políticas insuficientes, a degradação do clima destrói o nosso futuro colectivo. 

Cheias, secas, tempestades fora de época, subida do nível médio dos oceanos, sua acidificação e alteração das complexas correntes marítimas, incêndios florestais, libertação do metano pelo degelo das regiões árcticas, perda irreversível da biodiversidade e degradação do ar, dos solos e das massas de água são a consequência directa de escolhas deliberadas tomadas nas últimas décadas pelo aparelho produtivo e pelo poder político a nível global. Perante este estado de coisas, não estivemos nem ficaremos parados. 

Por isso, em abril - entre dia 2 e dia 16 - em Portugal, o Movimento por Justiça Climática vai marchar da Figueira da Foz rumando ao interior através de Pedrógão Grande, Oleiros, Vila Velha de Ródão e muitos outros lugares, descendo ao longo do Tejo até Lisboa. Percorrendo centenas de quilómetros para assinalar alguns dos responsáveis por esta crise e para falar directamente com as comunidades mais afectadas. 


PRECISAMOS DE TI PARA TORNAR A GRANDE CARAVANA POSSÍVEL 


PARTICIPA NA CARAVANA
Inscreve-te para um dos troços ou todo o caminho aqui: https://www.caravanaclima.pt/inscricoes/

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Contacta-nos através de: mail@caravanaclima.pt
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DOA PARA ESTA CARAVANA
Temos vários custos associados a esta ação, como impressões, deslocações, materiais de cuidados, alojamento e comida. Contamos com a solidariedade e colaboração entre grupos e pessoas para logística e materiais, contudo teremos sempre gastos financeiros. 
O climáximo, como uma das organizadoras da Caravana, ofereceu usar o open collective como uma forma de recolher contribuições. Obrigada pela tua ajuda!

A Grande Caravana Pela Justiça Climática é organizada por:

Acréscimo / Associação de Estudos do Alto Tejo / Associação de Pais do AE de Pedrógão Grande / Associação de Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande / Associação Portuguesa para o Estudo e / Conservação de Eslamobrânquios / BASTA! De crimes ambientais / Canal Pólen / Casa de Pedrógão Grande / ClimAção Centro / Climáximo / Colinas do Tejo / ecoCartaxo / ecomood Portugal / Flying Sharks / Gravito / Greve Climática Estudantil / Loving The Planet / Movimento Cívico Ar Puro / Movimento Ecologista do Vale de Santarém / Movimento Ibérico Antinuclear / Movimento Urânio em Nisa Não / proTejo / Reforma Florestal Já - Por Pedrógão por Portugal /Troca - Plataforma por um Comércio Internacional Justo. 
 



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Caravana pela Justiça Climática

Inspirados pela proposta de ação do Acordo de Glasgow decidimos avançar com a Grande Caravana pela Justiça Climática em Portugal.

Entre dia 2 de abril e dia 16 vamos fazer-nos à estrada! Em Portugal, como em vários outros países no Mundo, as caravanas pela Justiça Climática vão marchar durante centenas de quilómetros, atravessando as linhas da frente da luta pela Justiça Climática.

A Caravana pela Justiça Climática, em abril, vai percorrer 400 km em Portugal, marchando lado a lado com populações locais desde Figueira da Foz para o interior, através de Pedrógão Grande, Vila Velha de Ródão e muitos outros lugares. Para depois descer ao lado do Tejo até Lisboa. Neste momento, mais de duas dezena de organizações nacionais e locais já se juntaram à preparação da caravana, que também ocorrerá nível mundial em pelo menos mais cinco países – Uganda, Honduras, Turquia, Nigéria e Bolívia.

Podes ver aqui o percurso completo.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Contributo para a História dos Trabalhadores em Portugal

Centenário da morte de Eduardo Metzner


Em 1916, uma das pessoas que colaboraram na reaparição do jornal O Setubalense foi Eduardo Metzner. Contribuiu com um artigo que terá sido “muito apreciado”, com o título “Saudação a Setúbal”.

Era um poeta de intervenção. “Antigo seminarista, abandonou a carreira eclesiástica, tornou-se um dos mais audazes panfletários contra a monarquia”. E seria então “muito conhecido” nesta cidade [O Setubalense, 13/02/1922, p.1 e 21/02/1922, p.4].

Caiu no esquecimento, mas marcou o seu tempo. Saltou para a ribalta quando foi preso político sob a ditadura de João Franco, na fase final do reinado de D. Carlos. Segundo diferentes relatos da época, foi preso quando estava à conversa com alguns amigos, numa rua da baixa de Lisboa.

Terá criticado um recente caso de repressão. Um agente da polícia que ia a passar ouviu a conversa… Metzner já ia sendo conhecido como poeta libertário… “Ganhou” oito dias de prisão, dos quais quatro incomunicável. Não tinha mais que 18 ou 20 anos de idade.

Corria o ano de 1907. Como muitos anarquistas à época, Metzner estava algo seduzido pela propaganda republicana. Chegou até a homenagear o dirigente republicano Afonso Costa com a dedicatória de um poema.

Mas no ano seguinte já marcou a distância, ao publicar um volume intitulado «A República é uma mentira política: resposta ao opúsculo de Bernardino Machado “Só a República é a verdade”». Não deixou todavia de visar o regime que ainda vigorava. Em 1909, Metzner lançou o jornal A Revolta.

Durou pouco tempo, mas foi mais uma estocada na monarquia. Logo no primeiro editorial apontava o dedo: “a sociedade portuguesa desconjunta-se e precipita-se num abismo de corrupção” [A Revolta, 26/09/1909, p.1]. Metzner entusiasmou-se depois foi com a Revolução Russa de 1917.

Teve aliás um importante papel na sua divulgação em Portugal, ao traduzir a “Constituição Política da República dos Sovietes”, à qual acrescentou (na 3.ª edição) um texto de Trotsky, em jeito de prefácio. De sua autoria, Metzner publicou A verdade acerca de Revolução Russa (em 1919).

Trata-se de um livro bastante documentado e com um certo sentido crítico. Se apontava essa revolução como “a mais espantosa transformação social de todos os tempos”, não deixava de lhe reprovar alguns “excessos” e “abusos contra a Liberdade”.

Como outros anarquistas, teve então uma certa aproximação ao antigo Partido Socialista Português. Chegou a ser redactor do diário socialista O Combate. Mas no final de 1920, Metzner surgiu como um dos fundadores do Partido Comunista Português. Foi aliás ele quem presidiu à primeira reunião da “comissão organizadora” deste então novo partido.

Ironia do destino, essa reunião realizou-se no mesmo edifício onde depois funcionaria a sede da PIDE. Na altura era a sede do sindicato dos caixeiros de Lisboa. A polícia dissolveu a essa reunião alegando que não tinha sido previamente autorizada pelo governador civil, e porque na sede de um sindicato não se podiam discutir “assuntos políticos” [O Mundo, 23/12/1920, p.2].

Parecia afinal a República que Metzner já tinha antevisto em 1908? Nesta altura, ele já estaria doente. Faleceu quatorze meses depois, não tinha mais de 35 anos. Foi vítima de tuberculose, como tanta gente naquele tempo.

Em Março de 1921, ainda foi eleito para a “Comissão de Educação e Propaganda” do PCP. E ainda teve um papel importante na divulgação do novo partido. O seu funeral saiu da sede do sindicato dos jornalistas, com a respectiva bandeira a cobrir-lhe o caixão.

O cortejo para o cemitério terá sido acompanhado por “perto de 500 pessoas” [O Setubalense, 22/02/1922, p.7]. A ilustrar este artigo está uma caricatura de Eduardo Metzner por Almada Negreiros [Diário de Lisboa, 20/02/1922, p.5].

Luís Carvalho - Investigador

Artigo originalmente publicado no O Setubalense a 23 de Fevereiro de 2022

terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

Caravana pela Justiça Climática arranca a 2 de Abril e já conta com mais de 20 organizações em Portugal

 

Perante o panorama da crise climática, hoje, mais do que nunca, é preciso agir. Neste sentido, a Caravana pela Justiça Climática – uma iniciativa singular na luta pelo futuro – faz-se à estrada já no próximo dia 2 de Abril, partindo para uma jornada de 400 km pelo país, culminando com uma manifestação dia 16 de Abril no Parque das Nações em Lisboa. A Caravana pela Justiça Climática, que já junta mais de 20 organizações, assinala a sua partida na praia da Leirosa, a sul da Figueira da Foz, passando por várias zonas do centro do país até à sua chegada ao Parque das Nações, em Lisboa.

O percurso é composto por etapas diárias e está dividido em duas fases: uma primeira fase sobretudo a pé, passando pela Figueira da Foz, Montemor-o-Velho, Coimbra, Miranda do Corvo, Ferraria de São João, Pedrógão Grande, Sertã, Proença-a-Nova, Foz do Cobrão e Vila Velha de Ródão; e a segunda fase, predominantemente percorrida de comboio, que seguirá por Mouriscas, Pego, Constância, Vila Nova da Barquinha, Vale de Santarém, Cartaxo e Alhandra, até Lisboa. As jornadas diárias têm percursos entre os 10km e os 20km, podendo o percurso detalhado ser observado no website da caravana.

Actualmente, este evento sem precedentes conta com o envolvimento de mais de 20 organizações nacionais e locais, tais como Acréscimo, Basta de Crimes Ambientais, Casa de Pedrógão Grande, Climáximo, Colinas do Tejo, EcoCartaxo, EcoMood Portugal, Movimento Urânio em Nisa Não, Movimento Ecologista do Vale de Santarém, Movimento Cívico Ar Puro, ProTejo, Reforma Florestal Já!, Pólen, TROCA – Plataforma por um Comércio Internacional Justo, Movimento Ibérico Antinuclear, Loving the Planet, Greve Climática Estudantil, Gravito Healing and Retreat Centre, Flying Sharks, ClimAção Centro, APECE, Associação de Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande (AVIPG) e Associação de Pais do AE de Pedrógão Grande.

Durante a Caravana serão organizadas diariamente assembleias e debates com as populações locais e também serão apontados alguns dos principais responsáveis pela crise climática em Portugal (nomeadamente a Navigator Company, Trustenergy, Celbi, CIMPOR e Celtejo), com a denúncia do avanço de projectos e infraestruturas catastróficas, como as barragens de Alvito e do Pisão e o Projeto Tejo, que propõe um novo “Alqueva do Tejo”.

As inscrições estão neste momento abertas no site para participantes e organizações, podendo ser percorrida a totalidade do percurso ou apenas uma parte deste.

domingo, 20 de fevereiro de 2022

Grande Caravana Pela Justiça Climática Portugal

A crise climática é o tempo das nossas vidas. Enquanto empresas e governos repetem fórmulas esgotadas para políticas insuficientes, a degradação do clima destrói o nosso futuro colectivo. Cheias, secas, tempestades fora de época, subida do nível médio dos oceanos, sua acidificação e alteração das complexas correntes marítimas, incêndios florestais, libertação do metano pelo degelo das regiões árcticas, perda irreversível da biodiversidade e degradação do ar, dos solos e das massas de água são a consequência directa de escolhas deliberadas tomadas nas últimas décadas pelo aparelho produtivo e pelo poder político a nível global. Perante este estado de coisas, não estivemos nem ficaremos parados. Em Abril de 2022, em Portugal e por todo o mundo, vamos metermo-nos ao caminho, percorrendo centenas de quilómetros em vários países para assinalar alguns dos responsáveis por esta crise e para falar directamente com as comunidades mais afectadas.

Por isso, em abril - entre dia 2 e dia 16 -  em Portugal, o Movimento por Justiça Climática vai marchar da Figueira da Foz rumando ao interior através de Pedrógão Grande, Oleiros, Vila Velha de Ródão e muitos outros lugares, descendo ao longo do Tejo até Lisboa.

Para veres o manifesto da ação completo e quem o assina, clica aqui: caravanaclima.pt

PRECISAMOS DE TI PARA TORNAR A GRANDE CARAVANA POSSÍVEL

O Livro "José Afonso - Todas as canções"

PREFÁCIO

«José Afonso é o nosso maior cantor de intervenção!»

Este elogio tão consensual e aparentemente tão generoso é a forma mais eficaz de liquidar a obra do grande mestre da música popular portuguesa no que ela tem de universal e de artisticamente superior.

Não é sequer uma meia verdade. É, de facto, uma "falsa" verdade.

Reduzir José Afonso ao cantor de intervenção, que ele também foi, é induzir no grande contingente de distraídos a ideia de menoridade artística, (mal) associada à canção política.

É claro que, numa análise larga, podemos considerar cada cantiga de José Afonso uma canção de intervenção, na medida em que todas elas reflectem a sua forma de estar na vida e de a observar. Deste ponto de vista, cada uma das suas cantigas foi concebida deliberadamente à revelia da ideologia dominante e contra ela.

Na realidade, porém, as canções de conteúdo expressamente político são até minoritárias no conjunto da sua obra.

Arrumar José Afonso na gaveta da canção de intervenção, é não compreender que a dimensão da sua obra está ao nível do que de mais importante se fez na música popular universal do século XX. E se não teve o impacto mundial que merecia, foi tão-somente porque ele nasceu onde nasceu.

Além disso, essa etiqueta é um óptimo álibi para que os divulgadores musicais o possam banir com toda a tranquilidade Porque «a música de intervenção já teve o seu tempo e já não interessa ao grande público». Mas sejamos justos: se a rádio e a televisão ignoram a obra de José Afonso, esse facto não se deve apenas ao analfabetismo musical e ao mau gosto de muitos dos seus directores de programas. Deve-se também às imposições do mercado, para o qual e com o qual esses directores trabalham.

Sintomaticamente, essa marginalização não tem hoje reflexo no meio musical. Pelo contrário, de há uns anos a esta parte, José Afonso passou a ser o autor mais cantado por todas as gerações e diferentes escolas de músicos.

Este facto atesta bem a sua importância na história da música popular portuguesa. Graças ao seu talento excepcional, renovou a nossa canção popular a partir da tradição musical coimbrã em que se iniciou, integrando novas influências e marcando decisivamente as gerações seguintes. A esse papel não são estranhos três factores resultantes da sua própria vivência: o meio universitário coimbrão, culto e boémio, onde estudavam jovens oriundos de zonas rurais ou semi-rurais, que integrava já, na tipicidade das suas baladas, fortes influências da poesia e da música tradicionais de várias regiões do país, sobretudo das Beiras e dos Açores; a instabilidade, pouco normal para a época, da sua infância e da sua adolescência, que muito cedo o levou a contactar com meios socioculturais muito diferentes; uma cultura literária acima da média, adquirida sobretudo em Coimbra, que contribuiu para elevar os seus padrões de qualidade no uso da palavra cantada. Mestre incontestado da canção popular portuguesa, simultaneamente um genial autor e intérpetre de canções, cidadão exemplar e incansável lutador pela liberdade e pela justiça no contexto da ditadura salazarista, mas também no pós 25 de Abril, a sua vasta obra discográfica, iniciada em 1953 e terminada em 1985, constitui um manancial inesgotável de inspiração e de aprendizagem.

José Afonso deixou-nos em 1987. Num país tremendamente desculturado e desatento foi preciso esperar quase um quarto de século para ver aparecer o presente trabalho, que reúne as partituras de todas as 159 canções que gravou, com as respectivas letras e cifras, exceptuando apenas os fados de Coimbra de autoria alheia que interpretou.

Para que este livro possa constituir um complemento de alguma utilidade para quem pretender conhecer e estudar a sua obra, optámos pela transcrição fidedigna do que está registado nos fonogramas, independentemente de pensarmos, num ou outro caso, que poderia haver outras soluções ao nível da estrutura ou da harmonia. Pela mesma razão, não sugerimos qualquer hipótese de harmonização, quando a harmonia não é evidente no arranjo.

Apenas nos permitimos alterar a tonalidade de algumas canções na transcrição, nos seguintes três casos
 - Para que a partitura reflicta a digitação utilizada, nas situações em que a afinação habitual das violas foi alterada;
 - Quando os instrumentistas utilizaram um transpositor;
 - No limite, quando a tonalidade da gravação, com pequena diferença de tessitura, poderia dificultar desnecessariamente a leitura e a execução.

A autoria das letras e das músicas é de José Afonso, excepto quando são indicados outros autores.

Esperamos que este José Afonso - Todas as canções possam contribuir para um melhor conhecimento e estudo deste precioso património.

Guilhermino Monteiro
João Lóio
José Mário Branco

Octávio Fonseca

 

sábado, 19 de fevereiro de 2022

NOTA DE IMPRENSA
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19 de fevereiro de 2022


proTEJO ELEGEU HOJE OS SEUS ÓRGÃOS SOCIAIS E MOBILIZA-SE NA CARAVANA PELA JUSTIÇA CLIMÁTICA PARA MITIGAR ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS QUE ESTÃO NA ORIGEM DA SECA 

E ”POR UM TEJO LIVRE” DE AÇUDES E BARRAGENS QUE NÃO GERAM ÁGUA E AGRAVAM AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS


O movimento proTEJO elegeu hoje os seus órgãos sociais para o biénio de 2022/2024 e centrará a sua atuação durante o ano de 2022 nas seguintes ações:

a)     a mobilização dos cidadãos da bacia do Tejo para a Caravana pela Justiça Climática apelando à mitigação das alterações climáticas que estão na origem da seca, nomeadamente, pela criação de corredores ecológicos de floresta autóctone, vegetação ripícola e biodiversidade ao longo dos rios e ribeiros;

b)     a defesa um rio Tejo livres de barragens e açudes, com dinâmica fluvial adequada à preservação dos fluxos migratórios das espécies piscícolas e ao usufruto das populações ribeirinhas.

Lembramos que as barragens NÃO geram água e a água necessária e suficiente pode ser captada diretamente do rio e armazenada fora do seu leito, à semelhança da estação de captação de Vale da Pedra no Cartaxo, solução mais económica para os utilizadores e que evita maiores danos ecológicos.

c)     a participação na consulta pública do projeto de plano de gestão da região hidrográfica do Tejo - 2022/2027, que está a decorrer de 24 de janeiro a 24 de julho de 2022, defendendo a definição de caudais ecológicos à entrada do rio Tejo em Portugal na barragem de Cedilho e na Ponte de Muge, atuais pontos de controlo dos caudais mínimos da Convenção de Albufeira;

d)     a realização de ações pela despoluição dos afluentes do rio Tejo, nomeadamente, o rio Alviela;

e)     a celebração do Dia Mundial da Migração dos Peixes, em Vila Nova da Barquinha, no dia 21 de maio de 2022, “Por Um Tejo Livre - Educação Ambiental sobre Peixes de Água Doce” sobre as espécies piscícolas nativas, ameaçadas e invasoras com o envolvimento dos jovens da comunidade escolar para a sensibilização sobre a importância dos rios livres para a conservação das espécies piscícolas migratórias, com o apoio do Município de Vila Nova da Barquinha e da comunidade escolar.

A atividade integrará a apresentação dos projetos “Peixes Nativos de Água Doce”, “Livro Vermelho dos Peixes” e “Espécies Exóticas Invasoras Aquáticas de Sistemas de Água Doce e Estuarino – INVASAQUA” complementada com uma demonstração fluvial de classificação de espécies piscícolas nas margens do rio Tejo para promover o conhecimento e contato dos jovens as espécies piscícolas nativas, ameaçadas e invasoras.

 

O proTEJO – Movimento pelo Tejo tomou, em reunião do seu Conselho Deliberativo de 19 de fevereiro de 2022, elegeu por unanimidade as seguintes unidades organizacionais:

UNIDADES ORGANIZACIONAIS DO

proTEJO – Movimento pelo Tejo

2022-2024

Conselho Consultivo

Presidente

António Costa Falua

Mesa do Conselho Deliberativo

Presidente

José Manuel Sequeira Louza

Vice-Presidente

Pedro Alexandre de Sousa Triguinho

Secretário

Arlindo Manuel Consolado Marques

Porta vozes

 

Ana Maria da Costa Silva

Paulo Fernando da Graça Constantino

Além dos projetos acima referenciados pretendemos divulgar projetos de Educação Ambiental sobre “Água e Rios, bem como a efetivação de ações de Restauração Fluvial e de Educação Ambiental junto da comunidade escolar e em cooperação com os municípios que através do conhecimento da ecologia sensibilizem para a conservação da biodiversidade e do rio Tejo e seus afluentes.

Até final de fevereiro apresentaremos uma “Queixa à Comissão Europeia por Incumprimento da Diretiva Quadro da Água” pela permissão de inadequada gestão da água às concessionárias hidroelétricas por parte dos governos de Portugal e Espanha.

Esperamos finalizar, no próximo mês de março, a iniciativa legislativa de cidadãos para a proteção dos cidadãos / ativistas ambientais para subscrição no sítio do Parlamento como proposta de alteração da lei de proteção dos denunciantes que não contemplou ativistas ambientais de que é exemplo o chamado Guardião do Tejo Arlindo Marques que esteve a braços com um processo de difamação por ter denunciado infrações ambientais, mas que ficou fora do âmbito da proteção agora aprovada pelo Parlamento.

 

Bacia do Tejo, 19 de fevereiro de 2022


Ana Silva, José Moura e Paulo Constantino
(Os porta-vozes do proTEJO)

CONTRIBUTOS PARA A MEMÓRIA HISTÓRICA

A feminista Francine Benoit: De Setúbal à Seara Nova


Foi uma mulher que marcou a cultura musical no Portugal do século XX.

Em diferentes facetas: de professora a intérprete (pianista), de compositora a maestra, além de jornalista especializada.

Chamava-se Francine Benoit e afirmou-se numa época – anos 1920 – em que o meio musical português “era dominado por homens”, como sublinha Helena Lopes Braga – na dissertação de mestrado que lhe dedicou, em 2013.

Outro aspecto da biografia de Fracine Benoit é a sua acção cidadã, na oposição à ditadura de Salazar.

Em 1945, esteve entre as primeiras mulheres a apoiar publicamente o Movimento de Unidade Democrática (MUD).

Fez parte de duas associações feministas que acabaram dissolvidas pela ditadura, o Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas e a Associação Feminina Portuguesa para a Paz.

E foi também um elemento activo na Universidade Popular Portuguesa e na sociedade A Voz do Operário.

Depois do derrube da ditadura, e já octogenária, Francine Benoit ainda foi eleita para o conselho nacional do Movimento Democrático de Mulheres (MDM).

Faleceu em 1990, aos 94 anos de idade.

E permanece uma referência para o MDM, como “uma destacada intelectual, progressista, e lutadora pela emancipação das mulheres”.

Setúbal

Um traço da biografia de Francine Benoit é a sua ligação à cidade de Setúbal, onde viveu nos seus verdes anos.

Nascida em França, em 1896, era filha de pai francês e de mãe belga. Teria já 11 anos quando se mudou para Portugal. O seu pai veio trabalhar numa fábrica de conservas de peixe, em Setúbal. E nesta cidade, a família se terá radicado “pouco tempo depois do regicídio” – ocorrido a 1 de fevereiro de 1908.

Alguém recordou anos mais tarde, no O Setubalense:

Foi aqui, “na nossa cidade, onde a conhecemos bem pequena e onde permaneceu durante anos, vivendo com seus pais numa casa do Campo do Bomfim”. Era “filha de um empregado superior da casa industrial Léon Delpeut, então vítima de um desastre, de que morreu em Setúbal” [O Setubalense, 11/01/1936, p.4].

Nesta região, já foi atribuído o nome de Francine Benoit a uma rua de Fernão Ferro, no concelho do Seixal.

Seara Nova

Entre os inúmeros artigos de imprensa que Francine Benoit publicou ao longo de décadas, está a sua colaboração esporádica na Seara Nova, cujo centenário está sendo comemorado.

Ela publicou o seu primeiro texto nesta revista em 1931, numa altura em que ainda poucas mulheres ali marcavam presença. Esse seu texto foi aliás a única intervenção feminina num debate que ali se desenrolava sobre o “panorama musical português”. E a resposta que obteve é certamente ilucidativa da desegualdade de género que enfrentava.

O cavalheiro com quem Francine Benoit tentou debater ideias respondeu-lhe que a sua intervenção se equiparava – passo a citar – a um “qualquer bordado caseiro” e constituía um exemplo da “eterna superficialidade feminina, quando pretende exercer sobre o homem o poder da sua dialéctica inconsistente, polvilhada de lacunas” [Seara Nova, 17/09/1931].

Na Primavera de 1937, Francine Benoit ressurgiu na Seara Nova com mais três artigos. Num deles, deixou bem claras as suas preocupações de democratização da cultura e de justiça social. Falando de concertos de música clássica, defendeu a necessidade de adequar horários e programas para alargar o público aos “modestos empregados, os pequenos comerciantes, os trabalhadores de tantas artes e ofícios medianos, os verdadeiros anónimos” [S.N., 13/05/1937].

Uma década depois, Francine Benoit assinou o artigo principal de um número da Seara Nova. Um texto dedicado ao pianista Viana da Mota [S.N., 05/06/1948].

E em 1967 a Seara Nova publicou o discurso de Francine Benoit numa comemoração do centenário doutro pianista, Tomás Borba, por sinal, seu antigo professor de música [S.N., fevereiro 1968].

Luís Carvalho Investigador

Artigo originalmente publicado no O Setubalense a 15 de Fevereiro de 2022

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

O QUE É?

Durante 2 semanas em abril, começando dia 2, o movimento
por Justiça Climática em Portugal vai pôr os pés à estrada.
Vamos percorrer cerca de 400 km e ouvir as populações locais,
expor os responsáveis pela Crise Climática e expandir o
movimento para algo mais diverso, em mais localidades e mais
capaz e resiliente.


PORQUÊ?

A crise climática é o tempo das nossas vidas. Enquanto
empresas e governos repetem fórmulas esgotadas para
políticas insuficientes, a degradação do clima destrói o nosso
futuro coletivo. Os fenómenos extremos que temos observado,
entre outros a seca em Portugal hoje, são consequência direta
de escolhas deliberadas tomadas nas últimas décadas pelo
aparelho produtivo e pelo poder político a nível global. Perante
este estado de coisas, não estivemos nem ficaremos parados.


VAMOS CONSTRUIR O NOSSO CAMINHO!

Para conseguirmos travar a crise climática e a crise ecológica
globais, precisamos de um movimento maior do que o mundo
alguma vez já viu. Apelamos por isso a todas as pessoas que se
juntem a nós, transformando a Caravana pela Justiça Climática
num momento histórico que, através da força das populações,
se insurja contra a irresponsabilidade, a impunidade, a
manipulação e a ganância de um sistema capitalista,
responsável pela degradação dos ciclos ecológicos que
sustentam a vida e que são sustentados por ela.


SABE MAIS 

Website : caravanaclima.pt
E-mail : mail@caravanaclima.pt

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

MUDAR DE VIDA - JOSÉ MÁRIO BRANCO

Hesitei
Se havia de escrever esta canção
Porque a vida não se pode resumir numa canção
Mudar de vida…
Mudar de vida é uma questão
qu’inda não está resolvida
Aliás, para quê mudar de vida?
Estará assim tão mal a minha vida?
Mas o que é a minha vida
senão a própria vida
que está contida
em toda a força perdida
em toda a vida perdida
consumida
passada, repassada, ultrapassada
como se não fosse vida?
A minha vida – não há
Uma vida mesmo vida
só pode ser um espaço
que está dentro de um abraço
que se dá ou não se dá
Vida verdadeiramente
é sempre a vida da gente
que penosamente
insistentemente
inexplicávelmente
vai fazendo andar a roda
que fabrica a vida toda

Uma vida separada
se parada
se vida seca e mais nada
se for vida distraída
alienada
sozinha, irrelevante, e auto-ignorada
já não é vida vivida
Uma vida separada
não é vida nem é nada
São corpos minerais
nem plantas nem animais
Pois quem vive distraído
à conta do seu umbigo
quem não é capaz de dar a vida
pela vida de um amigo
está sozinho com os outros
e está sozinho consigo
… pelo menos, é assim que eu vejo as coisas…
Então,
mudar de vida p’ra quê?
Em tudo o que foi vivido
procuramos um sentido:
o que essa vida nos diz
uma matriz
um pendor
um sonho, um amor, um desamor, uma paixão
uma razão
– ou uma grande razão
Por baixo de cada vida
há essa roda que gira
com os ratinhos lá dentro
a fazer a roda andar
As coisas materiais
as coisas essenciais
o pão, a casa, os sinais
que são a vida directa
a existência concreta
As coisas que estão à mão
que nos parecem normais
- a paz, o pão, a saúuude, a habitação -
Então:
Mudar de vida?

Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento

Vida verdadeiramente
é sempre a vida da gente
que penosamente
insistentemente
inexplicávelmente
vai fazendo andar a roda
que fabrica a vida toda
Muitos de nós nem dão conta…
Achamos isso normal…

Mas afinal:
E a hora de trabalho que há em cada coisinha?
E o cansaço da mãe co’as panelas na cozinha?
Como se chama a Judite que me fez esta camisa?
Onde está o Eduardo que fez este projector?
E onde pára o Vladimir que ergueu aquela parede?
Estão não sei onde
Do outro lado daquilo a que nós chamamos vida
A vida deles
para nós não é bem vida
é – digamos assim – mercadoria produzida
São umas “coisas”…
Umas coisas que vivem… sei lá onde, sei lá como…
Viverão?
Essa gente
- tirando alguma excepção -
não está confortavelmente
aqui sentada à minha frente
ouvindo a minha canção
Vai vendo telenovelas
Olhos perdidos no espaço
A digerir o cansaço
A descansar do vazio
São corpos esgotados
destinados
a serem recarregados
que amanhã é outro dia
em que vão trocar por pão, ou tudo, ou nada
mais e mais mercadoria
fabricada, montada, embalada e transportada
que p’ra eles não vale nada

Estes de que falo são 66% da gente do meu país
Há mais 24% que sobrevivem nas pregas do pesadelo
Sobram dez
Dos dez por cento, são oito
os que duma ou doutra forma
levam cheios de arrogância
as migalhas do biscoito
que são o seu resgate da esperança
- que estão nas tintas pra tudo, a começar por si próprios
Ficam os tais dois por cento
os que a gente nunca vê
mas que nos veem a todos
Quem fabrica um parafuso
uns sapatos, uma estrada
qualquer coisa fabricada
recebe um xis pela hora
pelo gesto, pela vida emprestada
que não é vida nem nada
Amortizado o capital constante
pagas as despesas todas
incluindo o esperto que teve a ideia
fica então a mais-valia
que é a demasia
entre o valor da mercadoria
e os gastos do patrão
o esperto que teve a ideia
o empreendedor
que pôs os outros a viver p’ra ele
Porquê?
Porque os valores são outros
- Quais são os teus valores, Zé Luís?
- Os meus valores?
- Sim, quais são os teus valores?
- Bem… o Amor? a Liberdade, a Igualdade, a Fraternidade? a
Amizade? … a Justiça, ora aí está
– ah, e também a Honestidade
- E tu, aí, quais são os teus valores?
- Os meus valores?
- Sim, quais são os teus valores?
- Os meus valores estão na Bolsa de Valores
Ao qu’ isto chegou!
A minha vida p’ra isto?
é o que tendes p’ra me dar?
é o que tendes para me obrigar? para me impor?
Mudar de vida !

 Mudar de vida!
Mudar de vida é urgente
é o que diz essa gente
pelo menos
é o que pensa essa gente
é o que essa gente sente
Se a vida fosse dif’rente…
vida vivida de frente
vida cordata e feliz
Mesmo quando não o diz
é isso que a gente sente
Isso é que era bom! não faltava mais nada!
dizem esses que não vemos, mas que mandam nisto tudo –
Então, e a nossa mais-valia
a quem a vamos roubar?
“Horrorizais-vos porque queremos abolir a propriedade privada.
Mas na vossa sociedade actual a propriedade privada está
abolida para nove décimos da população. E é justamente porque
não existe para esses nove décimos que existe para vós.”
Mudar de vida
—  Mudar de vida!
Mostrar a vida escondida por baixo do sofrimento
Libertar a mais-valia que está na mercadoria
—  Libertar a mais-valia que está na mercadoria!
Uma vida mesmo vida
só pode ser um espaço
que está dentro de um abraço
que se dá ou não se dá
Vida verdadeiramente
é sempre a vida da gente
que penosamente
insistentemente
inexplicávelmente
vai fazendo andar a roda
que fabrica a vida toda
Mudar de vida?
—  Mudar de vida!

Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento.


Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento

Mudar de vida?
Mas como é que hás-de poder mudar de vida?
Poder
Mudar de vida
Mas como mudar de vida
se esta vida é uma ilha
perdida no oceano
e o nada a perder de vista
— só água, só água, só água funda e cavada
lá dentro não se respira
só se flutua e se nada
está-se sozinho e se nada
nada, nada, e mais nada
como na ilha de Antero
onde a vida é recusada
Nem sequer sei o que quero
Vamos a ver
se no esforço d’ap(e)neia
eu produzo alguma ideia
que me possa ter de pé
Se inda não sei o que quero
se inda não sei o que é
vou saber o que não quero
Vou deixar de dizer “eu”
E vou deixar de ser eu
Passar a ser também tu

Cantar a democracia
Aqui
nas margens da alegria
— o Antero e o Ruy Belo —
E vou tratar-te por tu
meu caro concidadão
porque na democracia
nós somos todos iguais
em direitos e em deveres
Mas desculpa perguntar
“em direitos e deveres”, muito bem
e…
nos teres e nos haveres?
E as palavras tão bonitas
…que estão na Constituição
Palavras tão bem escritas
— porque é que lá estão escritas? —
…que somos todos iguais
acabar co’a exploração
…que o que decide de tudo
é o voto, a eleição
Essa estrutura madura
com que exerces o poder
do cidadão
Será talvez poder?
Poder o quê?
Poder ir à comunhão
no dia da eleição
escolher
entre a fome e a vontade de comer?
Talvez mudar de vida?
—  Mudar de vida!

Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento
(coro sem letra - uníssono)
Então
e o que escolhes, cidadão?
Escolhes o quê?
Que tal é esse menu
onde quem decide és tu?
Será que ainda não topas?
Tu eleges
Eles governam
Governam e são governados
pelos privilegiados
do capital ab(e)stracto
que desde setenta-e-quatro
vem fazendo as suas opas
sobre tudo o que tu tens
dinheiro dos teus impostos
Opas p’ra todos os gostos
sobre as funções sociais do Estado democrático
Andas enganado, meu irmão
A eleição é um contrato
— Votem em mim, que eu faço isto, faço aquilo —
e depois?
Não é só não ser cumprido
é ser cumprido ao contrário
Virar o prego ao contrário
p’ra espetar na tua vida
Pra estrugir a tua vida
na panela inoxidável do mercado
Estás lixado
Tu pensas que é um contrato
Mas eles não têm palavra
Eles não estão lá p’ra isso
A palavra que eles têm
foi segredada baixinho
à mesa da reunião,
no jantar, ou no salão,
nos corredores com tapetes
onde ninguém faz barulho,
onde essas almas vendidas
vão vasar o seu entulho
Mudar de vida?
—  Mudar de vida!
O contrato da eleição
é um vestígio, um derriço
uma imagem de Jesus no oiro do Vaticano
Dá muitos milhões por ano
Porque a regra desse trato
não é contrato nenhum
É tudo publicidade
a ver quem melhor te enrola
nas eleições de amanhã
Durão-Sumol de maçã
E Sócrates-Coca-cola
Eleição – mis-ti-fi-ca-ção!
“Essa magestosa igualdade perante a lei,
que permite tanto aos ricos como aos pobres
passarem a noite debaixo das pontes.”
“De tantos em tantos anos,
decide-se quais são os membros da classe dominante
que vão representar e esmagar o povo no parlamento”.
— Ó Chico!
Queres Sumol ou Coca-cola?
Agora anda cá escolher
entre a fome e a vontade de comer

Escolhe, filho, escolhe — e fica parado, paradinho, a assobiar aos
cães, que o Portas vai-te resolver tudo com mais três submarinos
de guerra a doze milhões cada um, eles vão-te inventar umas
conversas
dessas
roteiros p’rà inclusão
o abono contra a exclusão
a europa social a dizer “olá pequeninos!”
eles fazem o favor de achar que é uma pena
os sem-abrigo e a fome
e tudo isso em teu nome
Elege, filho, elege — e produz a tua mais-valia, que é para ta
sacar que eles lá estão, foi para isso que os lá puseste
“Bem tentais não vos ocupar de política,
mas a política ocupa-se de vós”.
Não digas que não te avisei
Não te venhas cá queixar, amanhã
Se o teu patrão deu à sola
co’os teus vinte anos de vida
vinte anos de trabalho
Durão-Sumol de maçã
e Sócrates-Coca-cola
O dono disso tudo
é o capital ab(e)stracto
que são pessoas concretas
que tê-em muito dinheiro nas gavetas virtuais
Não sais da cepa-torta?
Pois não.
Sempre que os vais eleger
eles vão organizar como é que te hão-de torcer
cepo-torto, cepa-torta
muita vida mais que morta
vivida no não-viver
“Se o trabalho chamasse o dinheiro,
estavam os bois podres de ricos”.
Mudar de vida?
— Mudar de vida!
Mostrar a vida escondida por baixo do sofrimento
Libertar a mais-valia que está na mercadoria
—  Libertar a mais-valia que está na mercadoria!
Uma vida mesmo vida
só pode ser um espaço
que está dentro de um abraço
que se dá ou não se dá
Vida verdadeiramente
é sempre a vida da gente
que penosamente
insistentemente
inexplicávelmente
vai fazendo andar a roda
que fabrica a vida toda
Mudar de vida?
—  Mudar de vida!

Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento

Antero! meu Mestre!
Convoco-te ao fazer desta
com esse teu sinal vermelho
mesmo no meio da testa
A Unidade que procuraste
a Utopia dos loucos…
Disseste um dia
a chorar de alegria
de esperança precoce e intranquila:
“Vós, poetas, que sois os loucos porque andais na frente!”
Utopias
têmo-las todos os dias
realizamos umas tantas
a cada dia que passa

Nos anos 20 do século do mesmo nome, para tentar deter o
flagelo social da sífilis, que dizimava pobres e exércitos, o biólogo
alemão Ehrlich fechou-se no laboratório.
Tentou uma experiência e falhou.
Tentou duas, falhou.
Três, quatro, cinco, seis – falhou sempre.
Até que conseguiu um tratamento – chamou-se “tratamento
Ehrlich 606”.
Mas ainda não conseguia curar a doença sem matar o doente.
Então Ehrlich continuou, mais uma, e outra, e outra. A cura,
finalmente conseguida, chamou-se “Ehrlich 914”.
Quantas vezes já tentámos nós?
— novecentas e catorze? ainda não!
— seiscentas e seis? ainda não!
mas talvez… quem sabe
dez? vinte?
qual é o preço da esperança?

“Acordai!
Acordai! homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
Vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raiz!”
“Estamos de punhos fechados
mas temos as mãos nos bolsos”
Então:
Mudar de vida?
— Mudar de vida!

Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento

Antero! meu Mestre!
Convoco-te ao fazer desta
com esse teu sinal vermelho
mesmo no meio da testa
Disseste um dia:
“Não disputeis, curvado o corpo todo,
as migalhas da mesa do banquete:
Erguei-vos! e tomai lugar à mesa…”
Mudar de vida?
—  Mudar de vida!
Levar o sonho de Antero
às mulheres do Vale do Ave
às da Zara, às da Maconde e às da Rohde
aos homens da Pereira da Costa
aos homens da Sorefame
da Autoeuropa e da Azambuja
aos meus irmãos da Cova da Moura e da Arrentela
ao milhão de desprezados,
ao lixo do capital
aos seres humanos dispensáveis,
descartáveis, recicláveis
a esses olhares perdidos
dos nossos telejornais
Levar o sonho de Antero
aos humilhados e ofendidos
“Erguei-vos! e tomai lugar à mesa…”
Libertar a mais-valia que está na mercadoria

 — Libertar a mais-valia que está na
mercadoria!
Mostrar a vida escondida por baixo do sofrimento
Acordar a força
Acordar a força motriz
A energia matriz de onde nasce o movimento
A raiz
Mudar de vida!
— Mudar de vida!

Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar o pontapé na morte
Mudar de vida
Mudar de vida, romper
Romper o cordão da sorte
Mudar de vida
Mudar de vida, dar
Dar as mãos para o caminho
Mudar de vida
Mudar de vida, mudar
Que isto não muda sozinho
Mudar de vida
Mudar de vida, pôr
Pôr em marcha o movimento
Mudar de vida
Mudar de vida, acordar
Acordar o pensamento

PARA A MEMÓRIA HISTÓRICA DOS TRABALHADORES

No dia 24 de Fevereiro de 1962, falecia em Lisboa uma figura cimeira do sindicalismo português.

Sob o peso da censura de uma ditadura de tipo fascista, os jornais do dia seguinte não disseram nada.

Mas quem ia a enterrar era um antigo secretário-geral da CGT (Confederação Geral do Trabalho). E antigo director do diário sindicalista A Batalha.

Era um homem que havia sido preso político pelo menos seis vezes, mas que permaneceu fiel aos seus ideais até ao final da vida. Era anarquista. Ou “socialista-libertário”, como gostava de dizer.

E tinha sido também colaborador da A Voz do Operário.

OPERÁRIO MARCENEIRO

Filho de um ferroviário, José da Silva Santos Arranha nasceu a 3 de janeiro de 1891, na então vila de Caldas da Rainha.

Tornou-se operário marceneiro e rumou a viver para Lisboa, onde viria a casar com uma operária tabaqueira.

E aqui se salientou nas lutas sindicais, no período da 1ª Guerra Mundial. Foi aliás nessa altura, em 1916 e 1917, que colaborou no principal jornal operário que existia em Portugal: A Voz do Operário, então com edição semanal de 60 mil exemplares.

Neste jornal, Santos Arranha expôs duas lutas concretas do seu sector profissional. A primeira em torno do horário de trabalho, procurando conquistar um limite diário de 9 horas. A segunda por questões salariais, tentando recuperar poder de compra face à elevada inflação que se registava à época.

OS SINDICATOS ÚNICOS 

Alguns anos depois, em 1920, Santos Arranha destacou-se num processo de reorganização sindical que passou pela criação dos então chamados “sindicatos únicos”. Tratava-se de reunir trabalhadores do mesmo ramo de actividade que anteriormente estavam divididos em diferentes sindicatos de ofícios especializados.

No caso de Santos Arranha, a sua antiga Associação de Classe dos Operários Marceneiros de Lisboa aderiu ao novo Sindicato Único da Indústria Mobiliária de Lisboa. Santos Arranha foi um dos fundadores deste novo sindicato e um dos seus primeiros dirigentes, responsável pela “caixa de solidariedade e Bolsa de Trabalho”.

No final desse ano de 1920, ele foi também um dos fundadores da Federação Nacional dos Operários da Indústria de Mobiliário. 

A CGT

No congresso operário realizado em Outubro de 1922, na Covilhã, Santos Arranha foi eleito secretário-geral da central sindical CGT. E exerceu esse cargo durante um ano.

Uma preocupação central da CGT nesse período foi o agravamento do custo de vida. Para se ter uma ideia, até o governo republicano dizia que “a carestia dos géneros de primeira necessidade” atingia preços “exorbitantes” e que era “verdadeiramente aflitiva a situação de milhares de consumidores”. Mais reconhecia que existiam muitos “casos de exploração intensamente gananciosa” e de lucros “excessivos” que estavam “semeando a miséria” [Diário do Governo (1ª série), 21/10/1922].

Neste contexto, foi prioritária a luta pela recuperação de salários. Mas essa luta viu-se confrontada com outro problema, a repressão política sobre a classe trabalhadora: activistas presos, imprensa apreendida, sindicatos temporariamente encerrados, reuniões dissolvidas… Só no período em que Santos Arranha foi secretário-geral da CGT, ele próprio foi duas vezes preso, ambas quando participava em pacíficas reuniões sindicais.

Na acção da CGT nesse período é de salientar o trabalho de solidariedade com trabalhadores em luta. “Em Outubro de 1922 os mineiros de Aljustrel declaram-se em greve, reclamando melhores salários, luta que sustentaram ininterruptamente até Janeiro seguinte”. A CGT organizou então o acolhimento temporário dos filhos destes trabalhadores em famílias de Beja e Lisboa, “para subtraí-los à fome e ajudar os pais na sua luta”.

O processo repetiu-se em Lisboa e no Porto para apoiar trabalhadores em greve na Covilhã e S. Pedro da Cova. Acolhendo no total algumas centenas de crianças.

Como sublinharia Emídio Santana, estes “foram actos de solidariedade de um grande significado e demonstrativos das energias morais do movimento” [Santana (1987), Memórias de um militante anarco-sindicalista].

Em Outubro de 1923, Santos Arranha demitiu-se da liderança da CGT, no quadro das discórdias que à época dividiram o movimento sindical português. Discórdias sobretudo entre a corrente anarquista e a corrente comunista, mas também a nível interno da corrente anarquista.

No verão de 1925, Santos Arranha voltou à linha da frente como director do ‘órgão central’ da CGT, o jornal A Batalha. Cargo do qual de novo acabou por se demitir ao fim de um ano e pelas mesmas razões.

FASCISMO

Na fase que Santos Arranha dirigiu A Batalha, esse jornal marcou posição na denúncia e no apelo à luta contra a ameaça de uma ditadura militar e do fascismo. Uma ameaça bem real, que se concretizou com o golpe militar de 28 de Maio de 1926.

Em 1927, A Batalha foi encerrada, a CGT foi forçada à clandestinidade e Santos Arranha foi mais uma vez preso político. Viu-se depois constrangido a sair do país. Na década de 1930 viveu na Bélgica, onde integrou um sindicato de operários da construção civil.

Terá regressado a Portugal em 1939, para escapar à invasão nazi [segundo João Freire/Maria Alexandre Lousada (2013), Roteiros da memória urbana – Lisboa: marcas deixadas por libertários e afins ao longo do século XX].

Na década de 40, Santos Arranha foi militante de um grupo anarco-sindicalista clandestino: o grupo «Esperança». E quando faleceu ainda participava numa “tertúlia” que reunia velhos sindicalistas.

Artigo originalmente publicado no jornal A Voz do Operário a 03/02/2022

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

Solidariedade com as pessoas de Arrouquelas e de todas as localidades vítimas da indústria de pecuária intensiva

O Movimento Cívico Ar Puro, solidariza-se e apoia a justa luta das pessoas que vivem e trabalham na freguesia de Arrouquelas, em defesa dos seus mais elementares direitos, como, por exemplo, a saúde pública, os ecossistemas que sustentam a vida, tal como a conhecemos, o direito a respirar sem que lhe ardam as vias respiratórias, a arejar as suas habitações, usufruir dos espaços exteriores, etc.

Este movimento disponibiliza-se também para cooperar com as todas as pessoas, trocando experiências e informações derivadas de situações semelhantes em outras localidades, e que apesar dos procedimentos junto a todas as entidades com responsabilidades na actividade pecuária, perduram no tempo: em muitas localidades tem mais de meio-século. Isto, porque o problema é inerente ao modo como está estruturado o sector e subsectores, isto é, a produção intensiva de suínos, em reduto fechado, tem impactos devastadores em todo o espaço envolvente, tanto na saúde das pessoas, no seu bem-estar e qualidade de vida, assim como nos ecossistemas, nas águas superficiais e subterrâneas, por exemplo, derivado dos espalhamentos sistemáticos nos mesmos solos... 

Como tal, se persistirmos em enfrentar o problema, caso a caso, como se fosse um problema localizado numa só povoação, e não como um problema geral, estamos a desgastar-nos e a desbaratar forças sem que consigamos que os problemas sejam, de facto, resolvidos.